sexta-feira, abril 07, 2006
Incêndio em Tavira gera confusão na justiça
O incêndio registado no Tribunal de Tavira foi a “gota de água” que deu origem à circular do Ministério da Justiça. A juiz presidente, soberana nas suas decisões, prestou esclarecimentos à imprensa. Não podendo contrariar a posição da magistrada, a tutela “puxou as orelhas” aos funcionários judiciais.
A Direcção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ) queria ser a primeira a saber do incêndio de origem criminosa registado no Tribunal de Tavira. Situação que não veio a acontecer e resultou, um dia depois, na saída de uma circular dirigida aos funcionários judiciais do país.
O conteúdo do documento caiu mal, não só aos visados mas também junto dos magistrados, que vêem nele uma forma “encapotada” de intromissão na autoridade soberana conferida aos juizes-presidentes dos tribunais.
Todavia, “os jornalistas podem ficar tranquilos porque para informações e esclarecimentos relativos a tribunais poderão continuar a dirigir-se aos juizes-presidentes, e na recolha de imagens em audiências a autorização compete ao juiz que preside ao julgamento”, assegurou ao Observatório do Algarve o juiz presidente do circulo de Faro, Jorge Langweg, e também membro do Conselho Geral da Associação Sindical dos Juizes Portugueses (ASJP).
Magistrado que desautoriza assim o Ministério da Justiça em pretender intrometer-se em áreas cuja competência lhe está vedada.
A DGAJ refere, no preâmbulo da circular, que “tem sido confrontada, por parte de entidades estranhas ao Ministério da Justiça, com existência de diversas anomalias verificadas em tribunais e cuja ocorrência desconhecia (é o caso, por vezes de assaltos, inundações, incêndios, entre outras situações)”.
Perante tal, a DGAJ no papel legislativo que lhe está reservado de apoio ao funcionamento dos tribunais, determina na circular que “os senhores secretários de justiça não poderão autorizar a tomada de imagens no interior do tribunal”.
Caso o pretendam, a circular esclarece que “os pedidos de tomadas de declarações a funcionários de justiça sobre matérias de serviço deverão ser reencaminhadas” para a DGAJ.
“Não posso deixar de mostrar a minha estranheza pelo facto da circular se referir a matérias que cabe ao juiz-presidente de qualquer tribunal decidir”, lamentou o juiz Jorge Langweg, reconhecendo ainda existir uma coincidência de factos, entre “o incêndio de Tavira e uma inundação num tribunal do Norte, com o aparecimento da circular”.
No caso ocorrido em Tavira, a 29 de Março, a juiz-presidente, Ana Mónica Pavão, confirmou à imprensa as suspeitas de incêndio de origem criminosa, a destruição de 11 processos pelas chamas, mas que nenhum estava em fase de julgamento ou recurso, adiantando mais tarde que todos seriam recuperados.
Ministério Público e funcionários indignados
A circular publicada pela DGAJ “mostra pouco entendimento sobre o funcionamento dos tribunais”, realçou ao Observatório do Algarve, António Ventinhas, o presidente da Direcção Distrital do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, quando “as autorizações são dadas pelo juiz-presidente”, acrescentou.
Para este magistrado do Tribunal de Faro “estamos perante uma tentativa de ocultar as más condições de trabalho e de instalações a que estão sujeitos todos os que trabalham nos tribunais”, que contrariam “os tão falados privilégios que o senhor ministro diz terem os juizes e os magistrados do Ministério Público”.
Também o coordenador da Delegação de Évora do Sindicato dos Funcionários Judiciais, Vitor Norte, se mostrou indignado, por se querer “silenciar as sucessivas denuncias de falta de segurança das instalações, das más condições e excesso de trabalho, ultrapassados só pelo esforço de todos”.
O regulamento que ajusta o papel dos funcionários judiciais exige que não façam comentários ou declarações sobre processos ou actos de serviço.
Perante a exigência legal Vitor Norte interroga-se: “Dizer que chove dentro do tribunal ou sobre os processos é um acto de serviço? Ou queixar-se da falta de condições de trabalho são declarações sobre algum processo?”.
O ministro da Justiça, por seu lado, confirmou a existência da circular que proíbe os funcionários judiciais de proferirem declarações sobre "matérias de serviço" sem autorização, contestando que possa ter qualquer objectivo que limite as liberdades individuais.
"Seria quase insultuoso imaginar que no Ministério da Justiça existe uma ideia repressiva e limitativa das liberdades individuais", afirmou Alberto Costa.
Fonte: Observatório do Algarve
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