quarta-feira, abril 19, 2006

Privados nas prisões


A presença de vigilantes privados nas cadeias portuguesas, ontem admitida pelo Ministério da Justiça, é um dos objectivos assumidos de algumas das maiores empresas de segurança privada, que sublinham as vantagens de o Estado delegar funções.

“Os gastos são menores e o serviço é melhor”, resume Ângelo Correia, o ex-ministro da Administração Interna que preside à recém-criada Associação de Empresas de Segurança (AES).

“Há funções que são, e devem ser, exclusivas do Estado. A voz de prisão, a coerção e o uso de arma. Mas outras áreas da função segurança podem ser assumidas por privados”, defende Ângelo Correia. O sistema prisional é uma dessas áreas e ontem o ministro da Justiça deu o exemplo da função de “vigilância” dos guardas-prisionais como algo que os privados poderão assumir. De acordo com Jorge Leitão, vice-presidente da AES, seria algo que, a acontecer, não constituiria novidade: “Já acontece noutros países.”

A realidade internacional, de resto, ajuda ao optimismo da associação. “Nos próximos anos, deverá ocorrer um crescimento exponencial do mercado para as empresas de segurança”, prevê Ângelo Correia. Não apenas nas prisões, mas também nas florestas e nos bairros das grandes cidades. Em ambos os casos, diz a AES, a lógica é de contiguidade. “Não se faz segurança a um terreno, mas pode fazer-se a vários terrenos associados. Por outro lado, o serviço prestado a um prédio pode ser prestado a vários prédios, a uma rua inteira ou até a um bairro. Sempre em colaboração com a autoridade pública”, explicou Ângelo Correia.

À espera de crescer, o sector da segurança privada em Portugal emprega hoje cerca de 35 mil pessoas e a facturação das 133 empresas licenciadas anual ronda os 665 milhões de euros. Mas a AES está preocupada. “O Estado tem de cumprir as suas obrigações e fiscalizar os serviços prestados”, defende o presidente da associação.

Segundo a AES, as principais irregularidades detectadas em algumas empresas são a falta de formação, a carga horária excessiva e os salários pagos abaixo do acordado na convenção colectiva. As consequências, explica, são fáceis de concluir: milhares de euros por pagar à Segurança Social e o serviço prestado de forma deficiente numa área fundamental. “Não é admissível que haja empresas a concorrer a concursos públicos com preços abaixo do custo do serviço. E que não sejam excluídas”, refere Ângelo Correia.

CÓDIGO DE ÉTICA

Mais responsabilidade implica maior responsabilização. Confrontada com o alargar das áreas de serviço das empresas de segurança privada, a AES está a preparar um Código de Ética para os seus associados. “No entanto, um dos nossos objectivos no imediato é que o Estado cumpra a sua obrigação. A falta de fiscalização, na formação e nos horários, gera concorrência desleal e, no limite, é prejudicial para todo o sector”, defende Ângelo Correia.

PLANO PARA TIRAR CADEIAS DAS CIDADES

A Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública (FNSFP) acusou ontem o Governo de ter “interesses imobiliários” na transferência dos estabelecimentos prisionais Lisboa, Coimbra e Pinheiro da Cruz para a periferia das cidades. “Pinheiro da Cruz não está numa grande cidade. Está longe de tudo, junto à costa atlântica numa extensão de 1500 hectares, óptima para desenvolver projectos turísticos”, afirmou ao CM Paulo Taborda, dirigente da federação.

O ministro da Justiça, Alberto Costa, anunciou ontem em declarações ao Diário Económico, a intenção de “libertar as grandes cidades dos estabelecimentos prisionais”, através da “permuta dos actuais espaços prisionais em troca da construção de novos espaços”. A justificação do ministro não convenceu a FNSFP que não poupou críticas: “Se a intenção é retirar os centros prisionais do centro das cidades, não faz sentido acabar com o Pinheiro da Cruz. Há interesses imobiliários”, acusa Paulo Taborna.

AUTARCAS APOIAM INICIATIVA

O presidente da Câmara de Lisboa, Carmona Rodrigues, mostrou-se ontem surpreendido com a notícia. Ainda assim, diz que “é uma boa ideia”. Já o autarca de Coimbra, Carlos Encarnação, não foi apanhado desprevenido e revelou que o actual centro prisional de Coimbra será aproveitado para fins culturais. Quanto a Grândola, há tempo que o presidente da autarquia, Carlos Beato, manifestou a sua vontade em retirar o estabelecimento prisional do Pinheiro da Cruz do seu local actual, de forma a valorizar a zona, para a qual estão previstos diversos empreendimentos turísticos. Na altura, o autarca defendeu a construção de um “pólo universitário”.

in Correio da Manhã

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