sexta-feira, abril 14, 2006

Júdice aponta “sinais de arcaísmo” na OA


José Miguel Júdice apresentou no passado dia 6 de Abril o seu livro “Bastonadas – Vitórias e derrotas na luta pelo Estado de Direito”, onde as críticas à actual direcção da Ordem dos Advogados voltam a estar presentes.

Apesar de dizer que “é ainda cedo para afirmar – como tenho ouvido dizer um pouco por todo o lado – que o impulso reformista se perdeu e que a Ordem deixou de estar na primeira linha da luta pela reforma da Justiça”, o anterior bastonário reconheceu que “é verdade que sinais diversos de arcaísmo se tornaram, surpreendentemente aliás, muito visíveis de novo na Ordem dos Advogados”.

O clima de tensão entre Júdice e a direcção de Rogério Alves tem sido notória no último ano, depois de as declarações de Júdice sobre a necessidade de o Estado consultar as três maiores sociedades terem caído mal no seio da classe e levado à instauração de um processo disciplinar pelo Conselho Superior da OA. Desde então, as sucessivas acusações e tomadas de posição públicas não têm parado de ambos os lados. Recentemente surgiu mesmo um abaixo-assinado de solidariedade com Júdice, onde constam nomes como Rodolfo Lavrador, João Pereira da Rosa ou o ex-ministro da Justiça José Pedro Aguiar-Branco.

Em declarações ao ”Diário de Notícias” na segunda-feira, Júdice reconhecia que “há um mal-estar na Ordem”, dizendo que “nunca viu tantas críticas a um bastonário em exercício como agora”. No livro, Júdice afirma que vai optar pelo “silêncio que será de estilo, quer para aplaudir quer para criticar” no que se refere a temas internos da Ordem, “não seguindo o exemplo do meu antecessor”. Mas garante que “em relação à reforma do sistema judicial e da organização da Justiça não posso ficar calado, pois mais do que um direito é um dever de cidadania a minha intervenção, pelas funções que como bastonário acumulei.”

Sobre a actuação da actual direcção da OA, Júdice diz que “o certo é que toda a comunicação externa da Ordem dos Advogados surge vincada de mecanismos de pura reacção e de subordinação estratégica a linhas de combate em que os advogados portugueses não são os mais interessados”.

“Um balanço muito incompleto destes três anos inesquecíveis”

Prefácio
O livro é, evidentemente, um balanço muito incompleto destes inesquecíveis três anos em que tive a honra de ser bastonário dos advogados portugueses. (...) Mas um balanço, para ser minimamente rigoroso, teria de incluir gritos e gestos de revolta que tive por vezes de dar, os excessos em que incorri, os erros que inevitavelmente cometi, as (poucas) traições e faltas de lealdade que prejudicaram a estratégia, e seguramente uma análise de personalidades que tive de enfrentar, com quem tive de negociar”.

“O Arcaísmo Português”
“A formação oferecida pelo CEJ está estruturada para gerar um magistrado paradigmático, se possível sempre igual, de tal modo que o Direito seja aplicado de uma forma automatizada...”

“A resistência às mudanças tecnológicas, às inovações, a aposta na retórica e na verborreia mais ou menos literárias, (...), tudo isso contribui fortemente para a perpetuação dos arcaísmos”.

“O Estado não resiste à tendência para aumentar os custos da Justiça; e, por outro lado, o Ministério das Finanças (...) não se preocupa em analisar macroeconomicamente a aplicação dos recursos. O desperdício e o experimentalismo tornaram-se assim endémicos”.

José Miguel Júdice, in ”Bastonadas”


Por Márcia Galrão, in Diário Económico (Edição Impressa)

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