terça-feira, abril 25, 2006

Crime económico sem investigação


Mudanças da anterior direcção da PJ no combate à corrupção e crime económico forçaram a paragem quase absoluta de oitenta inspectores desde Janeiro.

O combate à corrupção e criminalidade económica “está parado” na Polícia Judiciária desde Janeiro. “Vive-se uma situação dramática”, adiantaram ao CM fontes da investigação – e a culpa, garantem, é “da reestruturação imposta pela anterior direcção”. As secções “foram desfeitas” e os inspectores “já não combatem os crimes em que estavam especializados”. São “quatro meses praticamente sem inquéritos enviados para o Ministério Público (MP)”.

Ainda assim, o CM apurou que, nos primeiros três meses deste ano, só em Lisboa, deram entrada no Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) 54 inquéritos relativos a corrupção e contra titulares de cargos públicos – precisamente a classe onde os especialistas dizem que este crime mais aumentou. Estes processos foram investigados durante 2004 e 2005 e concluídos no início deste ano. Nos mesmos três meses, a 9.ª secção do DIAP arquivou 70 casos e 15 acusações seguem para Tribunal.

Os efeitos da paralisação do combate ao crime económico “só se irão fazer sentir dentro de alguns meses, altura em que os processos, que deviam estar agora em investigação, estariam a entrar no DIAP, o que não vai acontecer”. Foram ainda “dadas ordens directas para que os processos há mais de seis meses no MP deixassem de constar nas estatísticas da PJ. Uma manobra em que os processos, ao serem abatidos à PJ, são dados como enviados ao MP. Resta é saber se estão concluídos...”

A “revolução” na Direcção Central de Investigação da Corrupção e Criminalidade Económica e Financeira (DCICCEF) foi levada a cabo “pelos ex-director nacional e director nacional adjunto da PJ”, juízes Santos Cabral e Mouraz Lopes – e deixou “baralhados” os 80 inspectores.

Divididos pelas antigas secções de combate à corrupção e restante crime económico, todos os inspectores “passaram a ser clínicos gerais.” Foram criadas três secções, em que os investigadores podem agora ter a seu cargo “qualquer processo. Há quem nunca tenha combatido corrupção e agora ande nos corredores a tirar dúvidas.”

O balanço do primeiro trimestre na DCICCEF, ainda sem números, “é dramático”, as investigações “estão praticamente paradas” e o MP “quase deixou de receber inquéritos concluídos”. Com a tomada de posse do novo director nacional, Alípio Ribeiro, e a entrada do juiz Moreira da Silva para a DCICCEF, os inspectores esperam “retomar o antigo modelo”, implementado por Maria José Morgado.

Mas a investigação criminal debate-se ainda com uma grande percentagem de inquéritos arquivados pelo MP, por falta de provas, prescrições ou inexistência de crime. Os números oficiais do ano passado apontam para 88% de arquivamentos na DCICCEF e, no geral da PJ, o ministro da Justiça, Alberto Costa, já alertou para apenas 18% de inquéritos que dão acusação – ideia de ineficácia que a PJ refuta categoricamente.

O CASO MOEDA FALSA

A passagem de moeda falsa é o crime que mais contribuiu para o elevado número de arquivamentos na DCICCEF. Antes de ser demitido, no início do mês, o juiz Mouraz Lopes “esperava as alterações à lei orgânica da PJ para retirar da sua alçada a investigação dos crimes de moeda falsa”, garantem as nossas fontes.

“Sabia que essas estatísticas iam servir de arma de arremesso contra ele, como se veio a comprovar. São crimes muito difíceis de investigar e onde um único caso dá, muitas vezes, origem a centenas de inquéritos”.

MORGADO CULPA INSTABILIDADE

Maria José Morgado, procuradora do Ministério Público e antiga responsável pelo departamento de combate à criminalidade económica da PJ, diz que não é possível trabalhar com a instabilidade que se tem vivido nos últimos meses.

“Não é possível trabalhar numa área tão difícil (crime económico) com a instabilidade que se tem vivido e sem uma estratégia bem definida”, afirmou Morgado ao CM, recusando referir-se em concreto à reestruturação da DCICCEF levada a cabo pelos ex-directores Mouraz Lopes e Santos Cabral.

“Todos sabem que eu defendo um método integrado, multi-disciplinar, com objectivos definidos e com consequências a nível punitivo”, acrescentou a procuradora, reiterando que o Ministério Público deveria assumir a “coordenação das Polícias” no combate à corrupção. Morgado, que criou o esquema da investigação dos crimes por especialidade, o que segundo o Ministério da Justiça “permitiu à PJ ter os melhores resultados de sempre”, revelou que ainda hoje chegam aos tribunais, designadamente ao da Boa-Hora, em Lisboa, processos do seu tempo na Judiciária (2002).

NEGRÃO DEFENDE PRIORIDADE

Já Fernando Negrão, antigo director nacional da PJ, defendeu, em declarações ao CM, que “qualquer reforma nas estruturas policiais, principalmente na investigação criminal, só deve ser feita quando devidamente amadurecida”.

O magistrado considerou que a situação na secção de combate à criminalidade económica impõem uma nova obrigação à recém-empossada direcção da PJ: “Que o combate a este tipo de criminalidade volte a ser uma prioridade e um bom exemplo”.
(...)

Notícia integral em CORREIO DA MANHÃ

Fonte: Correio da Manhã

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