sábado, abril 22, 2006

Calma


Eduardo Dâmaso

"O ministro da Justiça disse ontem que a Polícia Judiciária precisa de "calma para trabalhar" de modo a poder "desempenhar ainda melhor a sua função" e, por isso, escusou-se a falar sobre a inviabilização da ida do ex-director nacional Santos Cabral à Assembleia da República. Ora, o que a Polícia Judiciária precisa agora foi exactamente aquilo que ao ministro da Justiça faltou quando foi ao Parlamento insinuar que a PJ trabalha mais para o arquivamento do que para a acusação e que a gestão financeira da casa tinha sido deficiente nos últimos tempos.

Alberto Costa não teve a "calma" suficiente para evitar que as suas palavras funcionassem objectivamente como um acto incendiário. Ao pronunciar-se sobre os níveis de eficácia da polícia e sobre uma alegada gestão financeira de que obviamente seria co-responsável, fê-lo de forma demagógica e num contexto em que só agravou a delicadeza política da situação para si próprio e para o Governo.

Foi demagógico porque não é atribuível ao juiz Santos Cabral qualquer particular responsabilidade na alegada deficiente gestão. Santos Cabral não terá sido muito diferente na gestão do que foram outros directores e outras direcções. Simplesmente o quadro de disponibilidade financeira é aquele que é conhecido.

Com as acusações que deixou, Alberto Costa limitou-se a agravar o quadro de hostilidade por parte de todos quantos na magistratura são contrários à nomeação de magistrados para comissões de serviço. Por isso, aliás, a nomeação de um dos novos directores passou por uma unha negra no Conselho Superior de Magistratura. E esta é, aliás, uma questão que os magistrados deveriam encarar de forma mais consistente porque é óbvio que há magistrados a mais em comissões de serviço, há promiscuidade a mais entre magistrados e partidos e nada disso é saudável para a democracia.

Por outro lado, quando Alberto Costa diz que quer uma polícia que trabalhe mais para acusações do que para arquivamentos, tem toda a razão. A realidade, porém, não acompanha o ministro em todas as áreas de combate à criminalidade, a responsabilidade dos arquivamentos não é exclusiva da PJ e, por fim, Alberto Costa e o seu partido não são propriamente estreantes em matéria de responsabilidades na definição de políticas de combate à criminalidade e de gestão na área judicial. Em matéria de calma, portanto, o ministro não tem ajudado muito."

in Diário de Notícias

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