sábado, novembro 19, 2005

PS quis afastar Souto Moura


Escutas telefónicas comprometem dirigentes socialistas e do CDS

ESCUTAS telefónicas feitas no âmbito do «caso Portucale» surpreenderam conversas entre altos dirigentes e figuras do PS e do CDS, visando a demissão do procurador-geral da República, Souto Moura, e a sua substituição pelo jurista Rui Pereira (ex-director do SIS e secretário de Estado nos Governos do PS, e actual presidente da unidade de missão que estuda a reforma das leis penais).


As escutas em causa foram feitas ao telefone de Abel Pinheiro (dirigente do CDS e arguido no caso) e nelas surgem, entre outros, o ex-líder do CDS, Paulo Portas, Fernando Marques da Costa, conselheiro do Presidente da República, e o próprio Rui Pereira.

Nessas conversas afirma-se que José Sócrates queria substituir Souto Moura por Rui Pereira e que, ainda antes de tomar posse (aquanda da sua indigitação para formar Governo), teria auscultado informalmente Jorge Sampaio sobre a questão. Mas o PR rejeitaria, não concordando com o «timing» nem com o nome proposto.

Portas terá informado Pinheiro, dirigente com os pelouros das finanças e das relações interpartidárias do CDS, que Sócrates tinha pedido o apoio dos centristas ao nome de Rui Pereira. Este também contactou Abel Pinheiro para lhe transmitir a abordagem informal do indigitado primeiro-ministro, tendo recebido a confirmação do apoio do CDS.

Por seu turno, Fernando Marques da Costa, conselheiro do PR, discutiu várias vezes com Pinheiro a substituição de Souto Moura, chegando os dois a ponderar hipóteses de cargos fora do país para o actual procurador.

Abel Pinheiro chegou mesmo a dizer que era necessário encontrar «uma chupeta estrangeira».

Tudo isto ficou gravado e foi transcrito no processo Portucale. Segundo o EXPRESSO apurou, José Sócrates propôs de facto ao PR, mais do que uma vez e em termos informais, a substituição de Souto Moura (cujo mandato só termina em Outubro de 2006). Sampaio declinou sempre - e chegou a ter uma conversa com Souto Moura, em finais de Maio, informando-o disso mesmo.(...)O Presidente da República receava que a substituição fosse interpretada como uma vingança do PS por causa do processo Casa Pia, agravada pelo facto do julgamento estar ainda a decorrer. Além disso, Rui Pereira está muito conotado com o PS (tendo participado activamente na elaboraçã do programa eleitoral).(...)

in Jornal EXPRESSO, Semana n.º 1725, 19 de Novembro de 2005, capa e págs. 2 e 3

...Permitindo-nos usufruir legitimamente de mais uma quebra de segredo de justiça no nosso evoluído sistema processual penal, e a confirmar-se o teor da notícia avançada pela redacção do EXPRESSO, aqui temos mais um bom exemplo do que são as corriqueiras práticas políticas no nosso Portugal. Estes jogos de poder realizados nos bastidores da vida pública portuguesa retratam bem como vai o Estado de uma nação cada vez mais triste, deprimida, corrupta e traída pela falta de valores dos seus (ir)responsáveis representantes democráticos.

Esta concreta estória trazida hoje a nu pelo semanário citado, faz-nos reflectir numa ideia: PERIGO.

Não desprezando os conceitos jurídico-criminais de perigosidade que se desenvolvem a partir deste termo, quer no Direito Penal quer no Direito Processual Penal (de certo bem recordados e algumas vezes apregoados nas lições de faculdade tidas e proferidas por algumas das personalidades envolvidas neste triste episódio), cremos que o que realmente periga é cada vez mais,e a cada dia que passa a existência, manutenção e resistência do Estado de Direito Democrático em Portugal.

Com efeito, se a quem os cidadãos eleitores portugueses ainda esforçadamente confiam o seu voto, insiste em lhes defraudar as expectatias matando a esperança, O ESTADO DE DIREITO DEMOCRÁTICO ESTÁ EM PERIGO!

Se por necessidade de acautelar os devaneios de pedofilia dos camaradas de partido e a corrupção dos "inimigos" da oposição parlamentar, os representantes políticos dos portugueses logo em tempo de indigitação não olham a meios de sanear o cargo de quem foi legitimamente mandatado para assegurar a coesão de uma Magistratura representativa do Estado, defensora dos interesses que a lei determina, participante na execução da política criminal definida pelos órgãos de soberania, que exerce a acção penal orientada pelo princípio da legalidade e defensora da legalidade democrática, nos termos da Constituição, do próprio Estatuto e da lei, então: O ESTADO DE DIREITO DEMOCRÁTICO ESTÁ EM PERIGO!

Se aliado a tudo isto se estabelece uma estratégia de ataque a um poder judicial, não meramente auxiliada por uma comunicação social qual marionete apadrinhadamente manipulada, mas apetrechada de comparticipantes operacionais que, dentro daquele mesmo poder e sob a capa da insuspeita legitimidade advinda da lei e do princípio do juiz natural, não hesitam em ser autores materiais, autores mediatos,co-autores e cúmplices no salvamento da pele (terão receio de vir a ser punidos por omissão de auxílio?) a quem devem favores, então não há dúvida: O ESTADO DE DIREITO DEMOCRÁTICO ESTÁ EM PERIGO!

Portugal, ainda terás vontade de continuar a cantar e a rir, umas vezes assobiando para o lado, outras enterrando a cabeça na areia como a avestruz?

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