quinta-feira, novembro 03, 2005

Comunicado do Bastonário

02-11-05

A propósito de notícias recentemente veiculadas por diversos órgãos de comunicação social, que dão conta da constituição de alguns advogados como arguidos no âmbito de um inquérito criminal actualmente em curso, constituição essa levada a cabo na sequência de buscas e apreensões efectuadas nos respectivos escritórios, parece-me oportuno referir o seguinte.

A Ordem dos Advogados não pretende, naturalmente, comentar o teor do processo criminal em causa, o qual, além do mais, se encontra a coberto do segredo de justiça.

Para a Ordem dos Advogados, a defesa do segredo profissional mantém-se como uma prioridade, enquanto elemento essencial ao exercício da advocacia, à garantia da qualidade do Estado de Direito e como condição de confiança entre Advogado e cidadão.

Para a Ordem dos Advogados é absolutamente claro que o segredo profissional não pode, em caso algum, servir para auxiliar ou encobrir a prática de crimes, existindo na lei os mecanismos de prevenção e punição adequados, que actuarão quando se justifique.

A Ordem dos Advogados está absolutamente ciente da adesão da generalidade dos Advogados à preservação destes princípios e à defesa destes valores.

A Ordem dos Advogados, no quadro das suas atribuições, vai continuar a acompanhar situações como as descritas, analisando, nomeadamente, o efeito prático provocado pela redacção conferida ao artigo 71.º/4 do novo Estatuto.

Com efeito, está em causa verificar se, com a aludida redacção, se pode gerar a constituição de Advogados como arguidos, não por serem indiciados pela prática de qualquer crime, ou por contra eles correr um determinado processo, mas apenas por essa constituição ser condição “sine qua non” para a apreensão de correspondência nos respectivos escritórios, ainda que essa correspondência não contenha qualquer sinal de envolvimento nos factos investigados, indiciadora de responsabilidade criminal.

Caso este efeito venha a ser demonstrado, ou este risco considerado, deverão ser-lhe introduzidas as necessárias alterações.

O Congresso dos Advogados Portugueses, que se iniciará dentro de duas semanas, constituirá o momento adequado para um debate em profundidade sobre a matéria, que reclama uma particular atenção.

Rogério Alves


Artigo 71.º do EOA


Artigo 71.º
Apreensão de documentos

1 - Não pode ser apreendida a correspondência, seja qual for o suporte utilizado, que respeite ao exercício da profissão.
2 - A proibição estende-se à correspondência trocada entre o advogado e aquele que lhe tenha cometido ou pretendido cometer mandato e lhe haja solicitado parecer, embora ainda não dado ou já recusado.
3 - Compreendem-se na correspondência as instruções e informações escritas sobre o assunto da nomeação ou mandato ou do parecer solicitado.
4 - Exceptua-se o caso de a correspondência respeitar a facto criminoso relativamente ao qual o advogado tenha sido constituído arguido.

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