quarta-feira, novembro 23, 2005

Condições de trabalho do Tribunal de Setúbal - por Dr. A. Martins Cabral, Juiz de Direito

«Contributo para o levantamento das condições de funcionamento dos Tribunais, das razões da morosidade da justiça, e dos "privilégios" que usufruem os Magistrados.

O Tribunal Judicial de Setúbal foi inaugurado em Março de 1993. Já nessa altura não respondia às necessidades. Dizia-se que o projecto era de 20 anos antes. No edifício ficaram instaladas as Conservatórias de Registo Predial, o que já então, se criticava.

Diz o ditado que quem nasce torto, tarde ou nunca se endireita. E o Tribunal de Setúbal constitui um desses exemplos.

Assim, nos dias de hoje:

- O aspecto exterior do edifício do Tribunal é péssimo, sem pintura ou com a pintura desbotada, existindo placas que ameaçam cair.

- Salas de Audiências: O Tribunal tem 6 salas de audiências, as quais não satisfazem as necessidades. No edifício do Tribunal estão instalados: A Vara Mista - 6 Juizes; O Tribunal de Trabalho - 2 Juizes; 4 Juízos Cíveis - 4 Juizes; 3 Juízos Criminais - 3 Juizes, mais um Juiz Auxiliar; 1 Juiz de instrução. São frequentes os adiamentos de audiências ou o início tardio das audiências de julgamento, devido à inexistência de salas suficientes.

- O sistema de videoconferência está instalado em duas salas de audiências, funcionando deficientemente, designadamente em termos de ligações e em termos de audição.

- Os microfones estão avariados, sucedendo frequentemente que um único tem que ser utilizado por Juiz, por Magistrado do Ministério Público e Advogados. Aliás, o mesmo sucede nas restantes salas de audiência quando há que recorrer à gravação da prova.

- Não existem salas para diligências que não justificam, o formalismo da sala de audiência de julgamento. Por ex.: sessões conjuntas da Lei de Saúde Mental, interrogatórios e exames periciais no âmbito de processos de interdição, conferências de inventário em inventários.

- Salas de testemunhas - São inexistentes, uma vez que as salas iniciais foram transformadas em gabinetes. Deste modo as testemunhas esperam nos corredores do Tribunal.

- Biblioteca - A sala da biblioteca é utilizada para os senhores funcionários trabalharem em todas as formalidades de remessa de correio.Tal como na grande maioria dos Tribunais a biblioteca está deficientemente apetrechada.

- Elevadores - Estão frequentemente avariados e andar neles é uma ousadia, pois o pensamento é "um dia isto vai cair". De facto os sons estereofónicos que produzem são muitos e justificam tal preocupação.

- Gabinetes de magistrados - São exíguos em espaço e, grande parte deles, não tem mobiliário, digno.

- Ar condicionado - Nalguns gabinetes está avariado e....aguarda-se verba para o respectivo arranjo. Entretanto, os magistrados suportaram o calor e esperam não vir a suportar o frio.

- A maioria dos computadores não tem placa de som, impedindo que, quando se revela necessário ouvir, por exemplo gravações de escutas telefónicas para a respectiva validação, tal não se possa fazer. Embora o Itij tenha remetido um cd "e-tutor", "tutor de correio electrónico e tutor de acesso à internet", como a sua audição exigia placa de som, os magistrados ficaram privados da mesma.- Igualmente não têm porta USB, o que nos dias de hoje de desenvolvimento informático, é inconcebível.

- A maioria das impressoras funcionam deficientemente, com barulho e "comendo" folhas de impressão com gastos desnecessários. Assim, frequentemente, designadamente na impressão de sentenças, os magistrados utilizam impressoras pessoais.

- Não existem "scanner" nos gabinetes, cuja utilidade é demais evidente, recorrendo os magistradoscom frequência à utilização dos "scanner" pessoais.

- O acesso à internet é deficiente, dificultando o necessário acesso às bases de dados do Itij e à Imprensa Nacional - Casa da Moeda.

- Aos magistrados em estágio de pré afectação não foi atribuído qualquer computador, nem impressora, tendo os mesmos que recorrer aos seus computadores pessoais e impressoras.

- Secretarias - São exíguas, amontoando-se os funcionários entre os processos.- O material informático afecto aos funcionários judiciais encontra-se em péssimo estado de funcionamento. Assim:- Os computadores são antigos e estão completamente sobrecarregados, o que determina lentidão no seu funcionamento e dificuldades na realização das diversas operações exigidas pelo sistema "habilus".- As impressoras são antigas e estão deterioradas, com barulho e "comendo" folhas.

- Tal como na maioria dos Tribunais, verifica-se a ausência de controlo de entrada do público às audiências de julgamento e aos próprios gabinetes dos Magistrados.

- Pendência - A elevada pendência existente, designadamente a nível criminal, desde há vários anos que reclama a criação de mais Juízos Criminais. Apesar de tais reclamações, nada foi feito, tendo cada Juízo Criminal uma pendência de mais de 5000 processos, estando as audiências de julgamento a ser designadas para o ano de 2007. Foi criado no papel, há mais de uma dezena de anos, o Tribunal Judicial de Palmela, mas continua a "existir" apenas no papel, pelo que os objectivos que determinaram a sua criação não passaram de boas intenções.

Este, estou certo, é mais um exemplo das vistas curtas de quem decide construir edifícios para Tribunais sem saber ao que os mesmos se destinam, sem saber quais as exigências que reclamam e quais as funções que devem desempenhar.

Um Tribunal com 12/13 anos não corresponde hoje às necessidades. Este é mais um exemplo das más condições de trabalho que são dadas a quem exerce funções de soberania.Só falta os governantes virem dizer que....a responsabilidade é de quem neles trabalha.

Depois de tudo o que têm dito, não me admirava nada.»

in asjp.pt

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