domingo, janeiro 15, 2006

Suspeitas de identidades falsas inundam polícia


As suspeitas de utilização de identidades falsas em crimes cometidos a nível nacional e internacional estão a inundar os serviços da Polícia Técnica (PT) da Judiciária. Há cada vez mais pedidos de verificação e é crescente o número de solicitações que chega às instâncias de investigação para comparar nomes com impressões digitais. Este aumento, que tem sido contínuo, resulta do facto da identidade falsa estar a ser cada vez mais usada como um crime acessório para actividades ilícitas, nomeadamente nos domínios económico e financeiro.Em 2004, a PT efectuou verificações de identidade em 1078 processos, de nível nacional e internacional.

Em 2005, esse número subiu para os cerca de 1500 registos. Ramos Caniço, director do Departamento Central de Informação Criminal e Polícia Técnica (DCICPT), adianta que "no último ano e meio, temos sido inundados por pedidos da Interpol e da Europol para verificação da identidade de suspeitos" e que a circulação no domínio da identificação subiu exponencialmente "Recebemos pedidos todos os dias". Também o tempo de resposta parece ter diminuído em proporção igualmente significativa : "Há oito anos, qualquer pedido à Interpol poderia demorar meses a ter uma resposta. Hoje, é no próprio dia", garante Ramos Caniço.

Este crescimento acontece numa altura em que a União Europeia prepara a entrada em vigor da directiva, prevista para meados de 2006 (...), que obriga os novos sistemas de identificação civil a usar medidas biométricas (como a impressão digital ou a íris do olho). Um dos objectivos apresentados para esta medida - que resulta de um acordo com o governo norte-americano - é o de, exactamente, combater o terrorismo e a criminalidade.

De acordo com o responsável da DCICPT, a identidade falsa é usada como acessório de outros crimes, nomeadamente falsificação de documentos ou crimes económicos e financeiros. Está também associada a fraudes cometidas com cartões de crédito e na constituição de sociedades comerciais. Recentemente, surgiu ainda a suspeita da utilização de identidades falsas em casos de requerimento indevido do subsídio do rendimento de inserção social.

Portugal tem uma larga experiência na recolha de impressões digitais para efeitos de identificação civil e desde 1974 que os registos são microfilmados. A partir de Abril de 2001, os registos passaram a ser digitalizados. Os avanços efectuados neste domínio também a nível europeu estão a dar frutos e Ramos Caniço defende que "o aumento da procura da verificação de identidades resulta do facto de outros países terem também começado a recolher impressões digitais em situações diversas".

A recolha de impressões digitais em Portugal é efectuada sempre que um cidadão requer o bilhete de identidade e essa informação é armazenada. A polícia judiciária é uma das entidades que pode aceder à base de dados, no âmbito do que estabelece a Lei da Identificação Civil, ou seja "para efeitos de investigação ou de instrução criminal". E de acordo com os dados recolhidos pela Direcção-Geral dos Registos e do Notariado, que tem a tutela da base, são efectuados diariamente cerca de 60 pedidos de informação pelas autoridades policiais (ainda na fase de investigação) e judiciárias (no âmbito já de processos para julgamento) para efeitos de investigação e instrução criminal.


União Europeia avança para passaportes biométricos

A partir de Outubro de 2006, qualquer cidadão europeu que viaje para os Estados Unidos deverá estar munido de um passaporte biométrico. Ou seja, com um documento onde as características pessoais do seu utilizador (numa primeira fase a face e depois as impressões digitais) possam ser verificadas. A medida surge no âmbito do combate dos Estados Unidos ao terrorismo, mas não está isenta de críticas e preocupações.

Paulo Veríssimo, especialista português no âmbito da identidade digital e membro do European Security & Dependability Task Force Advisory Board - que aconselha a União Europeia neste domínio -, considera que "há uma certa precipitação dos governos europeus relativamente a esta identidade digital". Crítico da passividade das lideranças políticas europeias face às imposições norte-americanas, o especialista contesta a falta de reciprocidade da Europa face às medidas adoptadas pelos Estados Unidos. Cada europeu cidadão que viaja para os EUA deixa as suas impressões digitais numa base de dados. Mas a um cidadão americano que passe pela Europa não se regista elementos biométricos. E deixar a liderança do processo aos americanos, defende o especialista, "retira a capacidade de iniciativa europeia em termos de tecnologias a adoptar e procedimentos".

Outros problemas emergem desta conjuntura em volta da identificação biométrica e algumas ideias como a de um "cartão único" para os cidadãos podem ameaçar "a privacidade". Por isso, considera que este é "um momento perigoso". Avanços como a identificação biométrica, defende, "não podem ser guiados pela tecnologia - há aspectos societários muito importantes". Além de que não é uma solução para a criminalidade, já que a falsificação de documentos "não vai desaparecer". Por isso, se este processo for feito de "maneira errada" vai desproteger ainda mais os cidadãos já que a tecnologia pode aumentar a rapidez com que esses documentos são forjados.

Também um diagnóstico efectuado pelo Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia assinala que, se esta adopção de medidas biométricas pode, por um lado, ter um impacto económico positivo (pela criação de uma indústria no sector), o crime, por outro lado, não vai ficar parado e novas formas de criminalidade podem emergir.

Alemanha, França e Reino Unidos são alguns dos países que estão avançados na elaboração dos passaportes biométricos, mas o processo não tem sido fácil. Desde a primeira data acordada entre UE e EUA para a obrigatoriedade destes documentos, vários adiamentos foram depois anunciados, em virtude de dificuldades técnicas.

Também em Portugal, o Governo está a preparar os procedimentos necessários à implementação da nova directiva comunitária (Regulamentação do Conselho 2252/2004) que impõe a identificação biométrica. No espaço europeu, várias soluções podem vir a ser adoptadas. Em Inglaterra, numa primeira fase, os passaportes terão uma imagem numérica da face (ou seja, onde é medida a distância entre pontos chaves), mas avançarão depois, tal como estipula a directiva, para documentos com impressões digitais. Até porque, afirmou o ministro inglês da administração interna, "o Governo não quer que os cidadãos britânicos tenham passaportes de 'segunda categoria'". Também a Alemanha já lançou o seu próprio documento (introduzindo um chip electrónico sobre a fotografia) e prevê, a partir de 2007, que venham a ser registadas também duas impressões digitais.


PERGUNTA & RESPOSTA

O que é a biometria?

É uma qualquer característica humana que pode ser medida e usada para uma identificação automática. Os dados são "encriptados", ou seja, codificados pelo sistema, de forma a só ser possível um processo de autenticação. As mais conhecidas formas de identificação biométricas são as impressões digitais, o padrão da íris do olho ou os padrões faciais. Existem medidas menos conhecidas como a geometria da orelha, o odor corporal ou o movimento do corpo enquanto anda.

Para que é usada a biometria?

A maioria das aplicações têm a ver com três níveis. O primeiro é o da verificação, ou seja, determinar ser, de facto, quem diz ser. O segundo patamar de utilização tem a ver com a identificação, saber quem é determinada pessoa. Finalmente, temos o nível da pesquisa, ou seja, saber se determinada pessoa é procurada pelas autoridades policiais.

A biometria é fiável?

Não é um sistema 100% seguro devido às variações nas condições ambientais e diferenças nos sensores biométricos. Por isso, os especialistas defendem que é necessário procedimentos de segunda linha, até porque nem toda a gente pode fornecer características biométricas.

Então quais são vantagens da biometria?

Apesar de não serem 100% isentos de erro, a confiança nos documentos de identificação aumentará, já que serão muito dificilmente forjados. É nesse sentido que os especialistas e os responsáveis políticos europeus acreditam que o uso da biometria poderia limitar as fraudes de identidade. Por outro lado, têm vantagem sobre chaves ou passwords porque não são "esquecíveis" ou "perdíveis".

E desvantagens?

Não é um sistema universal. Por exemplo, estima-se que 5% da população mundial não pode fornecer a impressão digital. Por outro lado, existem preocupações no que diz respeito à privacidade e protecção de dados, também por falta ainda de enquadramentos legais fortes.

Que experiências existem já da utilização de impressões digitais?

A maior base de dados mundial de impressões digitais é norte-americana e conta com 47 milhões de sujeitos nos ficheiros criminais. A polícia britânica tem também uma base, mas mais pequena, com apenas 4 milhões de registos. Existem também registos de pedidos de asilo.

Fonte: Diário de Notícias

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