quarta-feira, fevereiro 22, 2006

Maioria das vítimas portuguesas calam agressões e não pedem justiça


A maioria das vítimas portuguesas não apresentam queixa junto das autoridades. Também não pedem indemnizações nos casos graves. E muitos dos objectos furtados encontrados pelas polícias não são reclamados. Os cidadãos têm falta de informação e de confiança na Justiça, argumentam os técnicos. Hoje é o Dia Europeu da Vítima de Crime.

A conclusão resulta da comparação dos dados de organismos que apoiam as vítimas de crime. E todos convergem na escassa participação dos portugueses quanto a queixas judiciais. Aliás, esse facto é comprovado pelo Inquérito Internacional de Vitimação, realizado há cinco anos com a colaboração do Ministério da Justiça, e que comparou os dados de 17 países, a maioria europeus, mas também o Canadá, a Austrália e o Japão.

Portugal apresentava a mais baixa participação às autoridades policiais, apenas 32% das ofensas criminais, quando média internacional era de 50%. O valor mais elevado registava-se na Dinamarca, 60%.

"Não era um crime sério"; "a questão foi resolvida pelo próprio"; "não vale a pena"; "a polícia não iria fazer nada", foram os argumentos para não apresentar o caso à polícia.


"As pessoas não devem pensar assim. Vale sempre a pena denunciar", contrapõe o subintendente Luís Elias do Departamento de Operações da Direcção Nacional da PSP. E explica: "É fundamental termos conhecimento dos ilícitos criminais, não só porque os cidadãos fazem uso dos direitos, mas também porque ajudam as autoridades a encontrar os autores dos crimes. O grande problema são os realizados por desconhecidos".

Os dados de 2005 da Associação de Apoio à Vítima (APAV), a que o DN teve acesso, indicam que apenas 43% das 6 701 pessoas que recorreram à organização apresentaram queixa junto das autoridades. Destas, 55,5% deslocaram-se à PSP; 31,5% à GNR e 6,7% ao Ministério Público. A APAV abriu 6186 processos, correspondendo a 14 375 factos criminais.

"As pessoas vêem a autoridade policial como a porta de entrada no sistema judicial e querem esquecer os maus tratos, fazer uma nova vida", explica João Lázaro, dirigente da APAV. E acrescenta: " Por outro lado, o sistema judicial não é célere e isso não ajuda. E quando a vítima está com um novo projecto de vida recebe uma notificação do tribunal. É um processo de revitimação".

Mas, quando não há denúncia, não se podem accionar os mecanismos de protecção. E, no caso dos objectos furtados, estes acabam por não ser entregues, à excepção dos carros. Grande parte dos artigos, nomeadamente relógios, rádios, carteiras e computadores, são vendidos e a receita reverte para o Estado.

Mas a inversa também é verdadeira, ou seja, há muitos queixosos que recorreram a uma autoridade policial e nunca viram os bens. Há melhorias, diz Luís Elias: "Com o Sistema Estratégico de Informação conseguimos fazer o cruzamento de informação e, com alguma eficácia, detectar onde foram apresentadas as denúncias dos objectos encontrados nas operações".

As pessoas não reclamam, mesmo no caso de crimes graves.

Em 2005, a Comissão de Protecção às Vítimas dos Crimes Violentos apenas recebeu 65 pedidos de indemnização menos um do que em 2004. Esta tem sido a média anual, com excepção de 1997 devido às indemnizações das FP-25 e em que os processos duplicaram. Em 2005, a maioria dos pedidos são de viúvas, cujos maridos foram vítimas de homicídio. A média da indemnização é de 15 mil euros, menos quatro mil que em 2004. Criada em 1993, a Comissão analisa as compensações nos crimes que provoquem lesões graves e uma doença de 30 dias ou que altere o nível de vida da vítima. O limite da verba é 30 mil euros.


Fonte: Diário de Notícias

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