quarta-feira, fevereiro 08, 2006

Autarquias representam 42% da corrupção investigada pela PJ


Boa parte das investigações sobre corrupção em Portugal atingem as autarquias locais. Em quatro anos, entre 2002 e 2005, quase metade das investigações (42%) da Polícia Judiciária sobre corrupção estão relacionadas precisamente com autarquias locais.

Os dados foram compilados pela Direcção Central de Investigação da Corrupção e Criminalidade Económica e Financeira (DCICCEF) e mostram que, em 2005, o número de processos de corrupção que saiu deste departamento com proposta de acusação aumentou significativamente.

"No que diz respeito às autarquias, hoje há dados concretos e não apenas meras percepções", disse ao DN o director da DCICCEF, José Mouraz Lopes, que ontem apresentou os números num debate promovido pela República do Direito, em Coimbra. Ressalvando que o estudo efectuado diz apenas respeito a dados quantitativos, Mouraz Lopes considera, porém, que estes "permitem traçar um quadro real para a investigação criminal no que diz respeito à corrupção e permitem também direccionar as campanhas de prevenção da corrupção, identificando as áreas de maior risco".

O director nacional adjunto da PJ salienta ainda o facto de ao nível da União Europeia existir uma forte aposta na prevenção criminal, de modo a "evitar certos comportamentos".

A próxima etapa passa por fazer um estudo qualitativo dos casos. Os que tiveram despacho de acusação e qual o resultado final (isto é, se passaram a fase de instrução e seguiram para julgamento) e os que foram arquivados. Sendo certo que, desde 2002, o número de processos investigados não tem sofrido muitas oscilações. Em 2002, foram abertos 291 inquéritos (no total), no ano seguinte registou-se um acréscimo com 349. Em 2004 o número de investigações sobre corrupção abertas baixou, para 270 inquéritos, tendo-se registado um novo acréscimo no ano passado, com a abertura de 341 novas investigações.

De acordo com os últimos dados apurados, nos quatro anos em análise, a DCICCEF e a Directoria do Porto são os departamentos que movimentaram um maior número de investigações sobre corrupção. Aliás, em Dezembro de 2005, o departamento da PJ no Porto concentrava 34% dos inquéritos em curso a nível nacional.

No ranking das áreas identificadas, depois da administração local, surgem as forças de segurança (o que poderá ter a ver com as inúmeras investigações realizadas em 2003 sobre a alegada corrupção na Brigada de Trânsito), com 15% dos inquéritos.

Seguem-se, com percentagens reduzidas, os casos investigados na administração central, justi- ça, desporto e IPSS (instituições privadas de solidariedade social).

DCICCEF é o departamento da PJ vocacionado para a investigação da criminalidade económica e financeira. Em matéria de investigação a autarquias, estão em curso os casos da Câmara Municipal de Lisboa (e um suposto favorecimento à empresa Bragaparques com o negócios dos terrenos da Feira Popular) e da Câmara Municipal da Amadora, sendo que este inquérito decorre, desde 2004, em articulação com o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) do Ministério Público. Por duas vezes, a autarquia foi alvo de buscas, mas ainda não há quaisquer arguidos constituídos.
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O encontro, organizado pela República do Direito, contou também com a participação do fiscalista Saldanha Sanches, que abordou a corrupção na administração fiscal.

Saldanha Sanches alertou para as redes de corrupção que alastram e questionou «a imunidade dos demais corpos centrais do Estado», interrogando-se «se não vai chegar à justiça».

O debate foi moderado pelo professor e penalista Faria Costa, que considerou que «a corrupção é a consequência da desagregação do Estado» e disse que o Direito Penal «pode fazer muito pouco».

O catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra criticou a «complacência da sociedade civil que vive afastada da coisa pública, como se ela não lhe dissesse respeito».



Fonte: DN e Expresso

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