quarta-feira, dezembro 14, 2005

O Preconceito dos Juízes / Um Testemunho - por Dr. Frederico de Frias Macedo Branco

O Dr. Frederico de Frias Macedo Branco, Juiz de Direito dos Tribunais Administrativos e Fiscais, remeteu um artigo para o Semanário Expresso que apenas o publicou parcialmente. O texto publicado no Expresso é constante deste ficheiro PDF.

Pela não deturpação ou restrição do pertinente conteúdo do pensamento ínsito neste artigo disponibilizamos também nós o texto integral do artigo para conhecimento geral.

O Preconceito dos Juízes/ Um Testemunho

Relativamente aos direitos e alegados privilégios dos juízes muito se tem dito, mas importará clarificar algumas questões face às quais muitos equívocos se têm verificado.

Se é certo que os juízes são e devem ser reservados, há verdades que não podem deixar de ser ditas, pois que a não ser reposta e clarificada a factualidade é Estatuto de todas as Magistraturas que é posto em causa.

O signatário, actualmente juiz de direito dos Tribunais Administrativos e Fiscais, ingressou na magistratura, tal como outros 83 colegas, através de um curso especial de recrutamento, e especial por mais exigente nos requisitos de candidatura e regime de frequência (5 anos de experiência comprovada na área do Direito Administrativo - e com exames semanais) e não por mais contemporizador na sua frequência, para o qual foram "aliciados" por concurso público.

Conhecedor do regime e funcionamento da Administração Pública onde exerceu durante diversos anos actividade, quer na Administração Local quer na Central, pode afirmar que, se é certo que os juízes por pudor ou preconceito não têm verdadeiramente falado em termos comparativos das diferenças dos diversos regimes vigentes, importa, para que conste, fazer o paralelo.

Desde logo, e no que às férias concerne, diga-se que os funcionário Públicos têm direito, não a 22 dias de férias, como se tem dito, mas sim de 25 a 31 dias de férias (DL nº 157/2001 - dependendo da idade e tempo de serviço), gozados em qualquer altura do ano, o que "bem gerido", significa o gozo de nunca menos de mês e meio de férias.

Ao invés, aos juízes passa a ser imposto gozar esses mesmos 25 a 31 dias úteis de férias, exclusivamente no mês de Agosto, no qual se terão ainda de realizar os turnos, o que significa que "sobrem " ao mês de Agosto, em média, 15 a 18 dias úteis para gozar os referidos 25 a 31 dias úteis de férias. Não é necessário ser génio matemático para perceber que os dias de férias dos juízes não "cabem" em Agosto. Será que ninguém reparou neste facto?

Quanto à questão remuneratória, onde são mais patentes os preconceitos dos juízes em falar do assunto, importa comparar a situação dos Juízes Administrativos e Fiscais, com alguns dos direitos das chefias da administração Pública.

Não se desenvolverá a questão de estarem os juízes Administrativos e Fiscais a exercer funções em tribunais de Circulo, onde julgam, por via de regra em colectivo, e auferirem como estagiários, questão sobejamente conhecida do poder politico, por ser uma questão técnica, que aguarda resolução desde há dois anos e três Governos...!

Mas voltando às regalias refira-se, em síntese que, mormente na administração Pública, designadamente na Local, é comum que qualquer Dirigente tenha Secretariado de Apoio, viatura e telemóvel de serviço, possa auferir remuneração suplementar por trabalho exercido em dias de descanso semanal, aufira subsidio de representação e possa exercer outras actividades, desde que não colidam com o exercício das suas funções, tendo ainda o normal período de férias de 25 a 31 dias gozado em qualquer altura do ano, ao contrário do Juízes, como é sabido.

O que se passa com os juízes dos Tribunais Administrativos e Fiscais, mormente os oriundos do curso especial de 2003?

A única "regalia" é estarem obrigados ao regime de exclusividade, não recebendo sequer qualquer remuneração acrescida pelo trabalho exercido em dias de descanso semanal ou fora de horas, e se quiseram e puderem, por exemplo, dar aulas no ensino Superior, terão de o fazer gratuitamente.

Poder-se-á dizer...: Sim mais o vencimento é principesco...!

Não!

Auferem, como se disse, desde há dois anos, como estagiários, não obstante terem todos eles anteriormente situações profissionais estabilizadas e maioria dos casos, melhor remuneradas.

Auferem em termos brutos os Juízes dos Tribunais Administrativos e Fiscais mensalmente 2.355 €, menos que qualquer dirigente da FP, a saber:

- Chefe de Divisão (2.600€);
- Director de Serviços (3.056€);
- Subdirector geral (3.488€);
- Director-Geral (4.190€), sendo que todos os referidos têm, como se disse, outras regalias, algumas das quais supra descritas.

Em síntese, embora abordar a questão remuneratória em termos comparativos possa ser entendido como mesquinho e pouco digno de um Juiz, mais impróprio seria calar uma situação de menoridade para que têm sido atirados os Juízes dos TAF's pois que, antes de tudo, gostam do que fazem e anseiam pela dignificação do seu Estatuto.

Sintra, 28 de Novembro de 2005
(Frederico de Frias Macedo Branco)

Fonte: www.asjp.pt

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