quarta-feira, dezembro 21, 2005

Combate à corrupção agita Polícia Judiciária


A Polícia Judiciária (PJ) prepara uma reestruturação profunda no combate à corrupção. As alterações, que serão hoje comunicadas aos operacionais da Direcção Central de Investigação da Corrupção e Criminalidade Económica e Financeira (DCICCEF) são as primeiras em 14 anos de existência daquele departamento e passam pela extinção de três secções.

A Secção Central de Investigação Anti-Corrupção, liderada por Pedro Fonseca, a Secção Central de Investigação da Criminalidade Económica e Contrabando, liderada por Rita Galamba, e a Secção Central de Investigação e Combate ao Branqueamento de Capitais, liderada por Manuela Santos.

Em sua substituição serão criadas duas grandes áreas de investigação; a dedicada ao branqueamento e às infracções tributárias, que terá três brigadas, e a dedicada à corrupção, que terá três secções centrais, todas com competência generalizada e com nove brigadas.

Estas mudanças estão a causar um profundo mal-estar dentro da polícia e fala-se já em “pressões políticas” sobre a condução de determinados processos.

O CM sabe que o coordenador da secção que se dedicava ao combate à corrupção já apresentou formalmente o seu pedido para sair da DCICCEF em protesto contra esta decisão. Um gesto que poderá ser seguido hoje por todos os inspectores – chefes que trabalham naquela área – o que iria paralisar as investigações de processos tão importantes como são os que envolvem a Câmara da Amadora e de Cascais, o caso Freeport ou a corrupção na Administração Fiscal.

O director nacional adjunto, Mouraz Lopes, justifica esta mudanças com a necessidade de “tornar a DCICCEF mais ágil e preparada para enfrentar o fenómeno da corrupção”. “Ao fim de 14 anos, o fenómeno da criminalidade é uma realidade diferente e quem negar isto nega uma evidência”, acrescentou aquele responsável, que negou “qualquer espécie de ingerência política” nesta reestruturação.

O QUE VAI MUDAR DA DCICCEF

PERITOS

A DCICCEF vai contar com um grupo de peritos que irá trabalhar em exclusivo para os processos que se encontram em investigação na Alexandre Herculano.

JANEIRO

Mouraz Lopes quer implementar o novo modelo na DCICCEF até dia 30 de Janeiro de 2006. “Penso que será uma transição pacífica com a colaboração das pessoas da casa”.

REFORÇOS

Em Fevereiro haverá mais uma colocação de inspectores que se espera venha reforçar as brigadas que combatem a corrupção e a criminalidade económica e financeira.

BUSCAS DELICADAS

A reestruturação no combate à corrupção é o corolário de uma série de acções que incomodaram o poder político e que culminaram com as buscas realizadas a casa do dirigente do Partido Socialista, Jorge Coelho. O CM sabe que após essa diligência, o coordenador da investigação foi duramente criticado pelo director nacional adjunto, que adiou mesmo as suas férias. O mesmo coordenador assinou o relatório final onde se pedia a prisão preventiva do presidente da Câmara Municipal da Amadora, Joaquim Raposo, um pedido que foi negado pelo Ministério Público. Foi ainda o mesmo responsável que liderou a investigação no caso Portucale que envolveu o BES.

"FOI UM MODELO DE PROGRESSO"

“A criação de um departamento especializado e de uma secção especializada no combate à corrupção foi um grande progresso que deveria ser aprofundado”, afirmou ao Correio da Manhã Maria José Morgado, procuradora-geral adjunta e ex-responsável pela DCICCEF. Salvaguardando sempre o facto de não querer intrometer-se na organização interna da polícia, a magistrada lembra que as organizações de competência especializada “correspondem a todas as recomendações feitas por entidades internacionais” e que a diluição das responsabilidades leva à perda de informação e de eficácia.

“Pessoalmente, receio que a publicidade que se está a dar à extinção desta secção possa ser mal compreendida pela opinião pública”, acrescenta Maria José Morgado. Em relação a um eventual aproveitamento por parte das organizações criminosas desta mudança, a procuradora refere que “o crime aproveita tudo, porque senão não seria crime”. Para Maria José Morgado o combate à corrupção não pode ser reduzido a um acto singular, mas antes deve ser um conjunto de acções continuadas.

GOVERNO ASFIXIA PJ

"O Governo tem vindo, nos últimos meses, a asfixiar a Polícia Judiciária cortando os meios humanos e materiais que servem de suporte à investigação”, afirmou ao CM Carlos Anjos, presidente da ASFIC – Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal. “Se em 2006 não forem abertos concursos, a PJ não poderá levar a cabo as funções que lhe estão a ser entregues”, refere Carlos Anjos, acrescentando, “estamos numa situação de ruptura”.

Por Miguel Alexandre Ganhão, in www.correiomanha.pt

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