O trabalho infantil mudou em Portugal para formas mais graves e violentas de exploração. O alerta vem do professor Manuel Jacinto Sarmento, do Instituto de Estudos da Criança da Universidade do Minho.
“Verificou-se uma passagem da exploração directa através de fábricas e ateliês para as piores formas de tráfico de menores, nomeadamente prostituição infantil, venda de estupefacientes e trabalhos domésticos classificados de muito pesados.”
Em 2000, segundo um relatório do Serviço de Informações e Segurança (SIS), havia cerca de 900 crianças, com idades entre os seis e os 14 anos, envolvidas em prostituição na periferia das grandes cidades. Eram meninos e meninas ao cuidado de instituições sociais, mas também de “avós, tios e vizinhos”. Residiam em zonas degradadas, coabitando com “muitas pessoas em situação económica precária e ligadas a actividades ilícitas”. Naquele contexto, acrescenta o relatório, a prostituição infantil acabava por ser encarada como “mais uma fonte de rendimento”.
Situação que deixou surpreendido o presidente da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Risco (CNPCJR). Em declarações ao CM, Armando Leandro assegurou que hoje mesmo vai saber o que se passa. “Esse é um assunto que merece toda a minha atenção, que me deixa muito preocupado e amanhã [hoje] vou tentar apurar.”“Há redes de prostituição infantil no nosso país, mas o total de crianças envolvidas não é conhecido, é um número aleatório, são as chamadas estatísticas negras”, sublinha Manuel Jacinto Sarmento, que coordenou a avaliação externa do Programa para Prevenção e Eliminação da Exploração do Trabalho Infantil (PETI).
O professor Manuel Sarmento é um dos intervenientes na conferência ‘Combate à Exploração do Trabalho Infantil no Mundo de Língua Portuguesa’ que entre 11 e 13 de Maio decorre em Lisboa. Neste encontro, será apresentada a versão portuguesa do relatório global da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre a exploração laboral de menores.
O organismo das Nações Unidas divulgou ontem as conclusões do relatório. A OIT conclui que pela primeira vez o número de crianças que trabalha está a diminuir no Mundo. Segundo a organização das Nações Unidas, mantendo-se o actual ritmo de declínio, o trabalho infantil, “na maioria das suas piores formas, poderá ser eliminado em dez anos”.
REDES DE DOIS TIPOS USAM CRIANÇAS
São de dois tipos as estruturas promotoras da prostituição infantil que operam em Portugal: há organizações internacionais que recrutam crianças para a produção de fotografias e filmes de conteúdo pornográfico e redes nacionais, de muito menor dimensão e âmbito, orientadas para a ‘prostituição simples’. O cenário foi traçado, em 2003, pelo Serviço de Informações e Segurança, num documento relativo a 2000.
Sobre quem paga os serviços das crianças, diz o SIS que “são normalmente homens de condição social elevada, frequentemente estrangeiros – sobretudo ingleses, holandeses e franceses –, muitos deles já indiciados ou condenados por crimes sexuais no seu país de origem”.
O pedófilo português é “sociável, ocupa uma posição privilegiada na sociedade e desempenha com frequência actividades que facilitam o contacto com as crianças”.
O pedófilo mais perigoso – avisa o SIS – é aquele em que a criança confia, em regra insuspeito, um familiar ou um amigo da família.
TRABALHAM NO NOSSO PAÍS 50 MIL MENORES
A Confederação Nacional de Acção sobre o Trabalho Infantil estimou, em 2003, em cerca de 50 mil o total de crianças que trabalham. Destas, 28 000 eram vítimas de trabalho infantil, dos quais 14 000 menores exerciam trabalhos perigosos. Números com os quais o professor Manuel Jacinto Sarmento (na foto) concorda. Professor doutor associado do Instituto de Estudos da Criança da Universidade do Minho, Manuel Sarmento (51 anos) é membro do Conselho Nacional de Educação e professor visitante da Universidade de Sorbonne (Paris). Pai de três filhos é investigador na área da sociologia da infância e director do mestrado da sociologia da infância. Realizou a avaliação externa do Movimento de Escolas Rurais e dos Territórios de Educação de Intervenção Prioritária.
ÁREAS GEOGRÁFICAS
AMÉRICA LATINA
Os países da América Latina e Caraíbas foram os que melhor combateram a exploração laboral. Em 2000, trabalhavam 17,4 milhões; em 2004 baixou para 5,7 milhões. Representam 5,1% do total de crianças.
BRASIL É EXEMPLO
Brasil é apontado como o exemplo a seguir ao ter registado uma quebra no número de crianças trabalhadoras de 61% no grupo entre os 5 e os 9 anos entre 1992 e 2004.
FRACA DESCIDA
Os Países Ricos, de Leste e Norte de África, estão ao mesmo nível da América Latina. Reduziram o total de crianças trabalhadoras de 18 para 13 milhões (5,2% do total).
Por João Saramago, in Correio da Manhã
sexta-feira, maio 05, 2006
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