quarta-feira, maio 17, 2006

Associação exige ao Parlamento lei que inclua todos os inférteis

A exclusão das mulheres inférteis que não estejam casadas ou em união de facto heterossexual do acesso aos tratamentos de infertilidade é contestada em termos veementes pela Associação Portuguesa de Infertilidade (API), um grupo de cidadãos inférteis que enviou uma carta aberta aos deputados, exigindo uma lei não discriminatória e mais "avançada" que aquela que está em preparação na Comissão Parlamentar de Saúde. A API enviou também uma missiva ao Presidente da República, com uma solicitação de audiência.

"As notícias recentes sobre os 'compromissos' da Comissão de Saúde deixaram-nos a todos num estado de pura consternação. Não bastava às pessoas inférteis a infelicidade da doença, não bastava o desprezo institucional a que vinham sendo votadas, agora perspectiva-se um diploma que definitivamente legitima a segregação oficial das pessoas inférteis", lê-se na carta enviada ao parlamento, em que se considera "absolutamente inaceitável num Estado de Direito" tal forma de discriminação entre os inférteis. Que serão, de acordo com as estimativas citadas pela API, entre 15 a 20% da população em idade reprodutiva, ou seja, meio milhão de portugueses.

Mais de 10 mil assinaturas

Fernando Oliveira, um dos membros da comissão instaladora da API, explica os objectivos da intervenção: "É urgente que passe na assembleia um diploma que não contenha falhas graves." Para tal, a carta enuncia 12 reivindicações essenciais. A primeira é da não discriminação de inférteis, independentemente da sua situação familiar. A segunda diz respeito ao financiamento do tratamento pelo Serviço Nacional de Saúde, que já era exigido numa petição do mesmo grupo de cidadãos, que recolheu mais de 10 mil assinaturas e deverá se em breve entregue no parlamento: solicita-se o custeamento dos cinco primeiros tratamentos, incluindo a medicação necessária (que neste momento não é assumida pelo SNS e custa muito caro. A comparticipação dos tratamentos pelos seguros de saúde, hoje não prevista, é também exigida. Esta matéria não é objecto do diploma que está em preparação no parlamento, já que os deputados a vêem como pertencendo à área da regulação governamental.

Mãe substituta é preciso

A maternidade de substituição, "para mulheres com defeitos congénitos do útero ou sem útero", é outra das necessidades apontadas pela API, e que a lei que se prepara deverá proibir (apenas se for detectado um "negócio", ressalva a presidente da Comissão de Saúde, Maria de Belém). Outra exigência da API que não está prevista no texto que deverá ser votado na especialidade a 23 de Maio é a sua inclusão na futura Entidade Reguladora da Procriação Medicamente Assistida - cujos nove membros são nomeados pelo parlamento e pelos ministros da tutela (Saúde e Ciência e Tecnologia).

As outras exigências da carta - desde a da doação anónima de sémen e ovócitos (conjunta, se necessário), assim como de embriões, ao diagnóstico pré-implantação do embrião (para despistar doenças genéticas ou determinar características necessárias ao nascimento de um bebé que permita salvar um irmão pré-existente), passando pela implantação, na mulher, de embriões resultantes de um tratamento feito em conjunto com um homem entretanto falecido, assim como a inexistência de idade máxima para o acesso ao tratamento - estão incluídas no texto legal existente.

Mas a API entendeu fazê-las pelo receio de que a liberdade de voto e as "convicções pessoais" dos deputados, mesmo dentro da maioria PS, possam pô-las em causa. Uma possibilidade que não é afastada por Maria de Belém, embora a socialista considere que os votos do PCP e BE deverão chegar para suplantar eventuais dissidências na sua bancada .

Por Fernanda Câncio, in Diário de Notícias

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