terça-feira, março 06, 2007

Ex-director da PJ contra concentração de poder


A nova arquitectura das forças policiais - que ficarão todas sob o comando de um secretário-geral para a Segurança Interna (SGSI) - levanta muitas reservas a Santos Cabral, ex-director da Polícia Judiciária (PJ). Em declarações ao DN, o juiz-conselheiro declarou que no caso da Judiciária há que acautelar o acesso do SGSI aos processos relacionados com a criminalidade económica, sobretudo casos de corrupção que possam tocar no poder político. Com o novo modelo, toda a informação da PSP, GNR, PJ e SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) passa a ser canalizada para uma só pessoa que reporta ao primeiro-ministro, José Sócrates.

Este é apenas um dos alertas que Santos Cabral (demitido da PJ pelo actual Governo, lembre-se) deixou ao DN. Já Rui Pereira e Mário Morgado, ex-director nacional da PSP, defendem as alterações, enquanto António Cluny, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) considera ser um retrocesso civilizacional a subordinação da investigação criminal à segurança interna.


"O novo modelo prevê que há uma entidade que vai ter acesso a tudo. O SGSI vai ter acesso ao Sistema Integrado de Informação Criminal, onde estão os processos em investigação. Portanto, ao mesmo tempo que há uma grande acumulação de poder, deveria haver um maior poder de fiscalização da Assembleia da República", disse ao DN Santos Cabral. Perante o modelo apresentado pelo Governo, o ex-director da Judiciária defende que a "prevenção e investigação dos crimes de corrupção passe a estar debaixo da alçada de uma agência fiscalizada pela Assembleia da República". "Há que criar um mecanismo de compensação para este novo modelo, porque há muita informação nas mãos de uma só pessoa e, hoje em dia, informação é poder", sintetizou Santos Cabral.

Cultura democrática

O modelo proposto pelo Executivo socialista assenta na criação de um SGSI que irá coordenar a acção das polícias (PJ, PSP, GNR e SEF). Segundo uma fonte ligada às questões de segurança interna, as competências atribuídas ao SGSI não são mais do que um upgrade na actual disposição do Gabinete Coordenador de Segurança, liderado pelo tenente-general Leonel de Carvalho.

Uma arquitectura que não encontra críticas no juiz desembargador Mário Morgado, ex-director nacional da PSP. "O controlo do poder político é uma falsa questão. O SGSI não vai imiscuir-se em processos concretos da PJ, porque esta, em matéria processual, está tutelada pelo Ministério Público". Mário Morgado considera que já existe uma suficiente "cultura democrática" para evitar abusos. "Até porque, se tal acontecesse, no dia seguinte as coisas estavam nos jornais e, em último caso, o Governo poderia cair."

Na mesma linha manifestou-se Rui Pereira, membro do Observatório para a Criminalidade e Segurança, considerando que Portugal necessita de um "conceito integrado de segurança interna que permita responder aos novos desafios".

Para já - tal como declarou o ministro de Estado e da Administração Interna, António Costa -, o SGSI será tutelado politicamente pelo primeiro-ministro, acumulando esta tutela com o Serviço de Informações da República Portuguesa (SIRP), órgão coordenador dos serviços de informações, SIS (Serviço de Informações de Segurança) e SIED (Serviço de Informações Estratégicas de Defesa).

Porém, fontes contactadas pelo DN admitem que, mais cedo ou mais tarde, a tutela do Sistema Integrado de Segurança Interna (SISI) passe para as mãos de António Costa, número dois do Governo.

Faz sentido manter a PJ?

Também em declarações ao DN, António Cluny, presidente do SMMP, levantou reservas quanto à inclusão da Judiciária no seio do SISI: "A PJ é um corpo de investigação autónomo vocacionado para o trabalho com o MP ou o juiz de instrução. Fora deste âmbito, faz sentido manter um corpo como a PJ?", questiona. Por outro lado, Cluny manifestou-se contra a inclusão do PGR no Conselho Superior de Investigação Criminal, tal como fez ontem o PSD.


Por Carlos Rodrigues Lima, in DN Online.

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