quarta-feira, setembro 06, 2006

Supremo não pode ser reforma para políticos

Poucos minutos depois de o Presidente da República ter sublinhado a “competência, independência, frontalidade e verticalidade” de Nunes da Cruz, ao longo de 40 anos de trabalho ao serviço da Justiça, o presidente cessante do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) voltou a ser contundente nas críticas à última medida conhecida do Governo no sector da Justiça.

"Discordo disso. Sempre disse com frontalidade que o Supremo não pode ser uma reforma para políticos em fim de carreira”, afirmou o conselheiro jubilado a propósito da intenção do ministro da Justiça em introduzir o princípio da carreira plana que permitirá que sejam nomeados juristas de mérito para os tribunais superiores, enquanto que os juízes poderão não passar dos tribunais de primeira instância – medida já criticada pelos juízes, que falam em “politização da Justiça”.

“O que pode não estar errado é dar uma maior possibilidade a que outras pessoas concorram ao Supremo. Queremos no Supremo os melhores”, acrescentou Nunes da Cruz, depois de ter sido condecorado por Cavaco Silva com a Grã-Cruz da Ordem de Cristo – concedida por destacados serviços prestados ao País.

“Foram mais de 40 anos ao serviço da Justiça portuguesa. Percorreu todos os degraus da Magistratura com grande dedicação e dignidade”, sublinhou o Presidente da República, frisando tratar-se de “uma cerimónia singela, mas com significado de Estado particular”.

“Todos lhe reconhecem a competência, independência, frontalidade e verticalidade”, disse o Chefe de Estado.

Nunes da Cruz retribuiu as palavras “simpáticas” – “que talvez não mereça”, acrescentou – revelando estar surpreendido com a condecoração: “Não tinha ideia de que pudesse receber este galardão. Mas é uma recompensa de todos os sacrifícios que fiz, dias e noites que trabalhei, com prejuízo para a família”.

Nunes da Cruz sucedeu a Aragão Seia na presidência do STJ, no início de 2005, altura em que Alberto Costa assumiu a pasta da Justiça e anunciou uma série de medidas contestadas por todos os operadores judiciários.

O presidente cessante do Supremo Tribunal de Justiça esteve sempre ao lado da magistratura, e chegou mesmo a acusar o Governo de mentir. Na hora da despedida, o conselheiro manteve o tom, mas garante que não leva mágoas.

O sucessor de Nunes da Cruz será escolhido no dia 28 de Setembro. “Infelizmente, penso que as próximas eleições não serão muito disputadas”, previu, ontem, o conselheiro, que não apoiará nenhum candidato.

CONDECORAÇÃO DE NUNES DA CRUZ

Entre os vários convidados e amigos, muitos deles caras conhecidas, quatro crianças tiveram direito a um abraço especial: os netos de Nunes da Cruz que, impacientes, mal a cerimónia acabou, saltaram para o colo do avô. Visivelmente emocionado e “muito honrado” com a condecoração, o presidente do Supremo também agradeceu à família.

APONTAMENTOS

LABORINHO LÚCIO EM DESTAQUE

Laborinho Lúcio, ex-ministro da Justiça de Cavaco Silva e um dos nomes mais apontados para suceder a Souto Moura na Procuradoria-Geral da República, foi um dos muitos convidados presentes na cerimónia de condecoração de Nunes da Cruz, e o único a merecer destaque – além dos presidentes dos tribunais – na galeria de fotografias do ‘site’ da Presidência da República.

CANDIDATOS AO SUPREMO EM SILÊNCIO

Noronha do Nascimento e Pinto Monteiro, os mais que prováveis candidatos das próximas eleições para a presidência do Supremo Tribunal de Justiça, a 28 de Setembro, marcaram presença na condecoração do conselheiro Nunes da Cruz, mas ambos recusaram fazer declarações. Apesar de ter sido derrotado nas últimas eleições pelo presidente cessante do Supremo, quando todos já lhe davam a vitória, Noronha do Nascimento cumprimentou Nunes da Cruz. Mais sorridente foi o abraço entre o agraciado e Pinto Monteiro.

Por Ana Luísa Nascimento, in Correio da Manhã

Sem comentários: