sexta-feira, setembro 29, 2006

"A influência junto do poder depende de quem é o bastonário"


Rogério Alves não tem tido uma vida fácil enquanto bastonário da Ordem dos Advogados (OA). Assumiu a liderança da instituição numa altura em que a crise da Justiça estava no auge, com o polémico processo Casa Pia, e em que o prestígio dos advogados estava em queda, tem em mãos o problema da massificação da advocacia - que anda a par e passo com o da proletarização-, "abriu guerra" com um dos pesos-pesados da advocacia, o ex-bastonário José Miguel Júdice, e é alvo de cerradas críticas, vindas de várias facções da classe. Muitas motivadas, precisamente, pelo processo disciplinar movido contra Júdice.

Os seus críticos manifestam-se descontentes com o caminho que a OA tem trilhado e acusam o 23.º bastonário de ter reduzido o protagonismo da Ordem e a sua influência junto do poder político. Mas há quem sustente que a perda de influência da Ordem não é de agora. "A Ordem tem perdido influência e prestígio e a responsabilidade não é só de um bastonário, é de todos os bastonários e de todas as direcções nos últimos 20 anos", sublinhou ao DN o advogado António Marinho Pinto, que perdeu para Rogério Alves a liderança da Ordem, que comemora amanhã 80 anos.

Sem programa de intervenção

Mas há quem concentre responsabilidades em Rogério Alves: "O protagonismo positivo e mobilizador da Ordem esfumou-se depois do mandato do dr. Júdice", disse ao DN o advogado de Coimbra Castanheira Neves, para quem "a OA perdeu abruptamente a capacidade de mobilização da classe e de intervenção junto do poder político".

Também João Pereira da Rosa (que é candidato a bastonário) considera que a "OA tem perdido influência", limitando-se a actual direcção, segundo disse ao DN, a "ser comentadora da lei, sem qualquer atitude de afrontamento" - "A influência da Ordem depende muito de quem é o bastonário". Na mesma linha, Paula Teixeira da Cruz (apoiante de Júdice) acusa Rogério Alves de não "ter um programa de intervenção para dentro e para fora da Ordem" e sustenta que, no bastonato de Júdice, "havia coincidência entre o peso mediático e o peso real do bastonário". A advogada lembra que Júdice deixou como herança "o Estatuto da Ordem dos Advogados e a Lei dos Actos Próprios" e sublinha: "Deste [bastonário], ainda não posso falar em nada de concreto."

Paulo Rangel, ex-secretário de Estado da Justiça (ao tempo de Santana Lopes) explica: "Cada bastonário faz o seu lugar, é evidente que a influência também depende de quem é bastonário. Castro Caldas e Lopes Cardoso, por exemplo, tinham grande influência nos bastidores, mas eram discretos, Pires de Lima e José Miguel Júdice tinham um grande peso, Rogério Alves tem uma presença maior e um peso menor, não tem o mesmo currículo, apenas porque é mais novo." O ex-governante rejeita no entanto a ideia de que a OA tenha perdido influência nos últimos anos.

Cortes Martins, advogado que é também membro do actual Conselho Geral da OA, desvaloriza as críticas: "O bastonário não tem tido atitude de afrontamento propositadamente, porque não deve ser esse o caminho da Ordem." No início do seu bastonato, o próprio Rogério Alves chegou a queixar-se da falta de diálogo do Governo para com a Ordem. Cortes Martins garante que agora a situação mudou e que "já existe uma relação de influência possível" entre a Ordem e o poder executivo.

Por Inês David Bastos, in DN Online

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