É um homem controverso, que não agrada a gregos e troianos, bem pelo contrário, e que só em um ou outro aspecto reúne a unanimidade das opiniões. Diz quem lhe é próximo e quem com ele está desavindo que é um homem inteligente, tecnicamente bom no que ao direito diz respeito, hábil conversador e culto. E chega. A convergência entre as apreciações dos seus pares fica por aqui. Tudo o resto são visões diametralmente opostas do juiz de carreira, conselheiro há oito anos, que hoje será com toda a certeza eleito presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).
Não sem polémica. Ingrediente, aliás, que tem ditado o seu percurso profissional, quer quando passou pela presidência da Associação Sindical dos Juízes (ASJP), entre 1992 e 1996, quer quando foi vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura (2001/2004).
"Tem uma personalidade forte, que por vezes suscita polémica dentro e fora da magistratura", disse dele o desembargador Alexandre Baptista Coelho, ex-presidente da ASJP.
Um juiz com "anticorpos"
Noronha Nascimento é assim. Um homem que desperta simpatias ou antipatias. Viscerais. Não há meio-termo. "Ou se gosta dele ou não se gosta", disse ao DN o juiz-conselheiro jubilado Fisher Sá Nogueira. O antigo membro do STJ reconhece que Noronha Nascimento - que se torna aos 62 anos a quarta figura do Estado - "tem muitos anticorpos na magistratura", muito por culpa de ser, apesar de "muitíssimo esperto", um "pouco impulsivo" - "quando uma pessoa é impulsiva as probabilidades de dizer qualquer coisa que cai mal são grandes".
Como quando manifestou desagrado pelo facto de existirem cada vez mais mulheres na magistratura e em licença de parto. É certo que não estaria a manifestar-se contra a maternidade, mas mais contra a dificuldade de gestão da bolsa de juízes, mas a ousadia do discurso valeu-lhe a antipatia de muitas colegas. Ou quando, em 2005, surpreendentemente, contra o que estava delineado, avançou com uma candidatura à presidência do Supremo. Acabaria por perder por dois votos para Nunes da Cruz.
Mas alcançar a presidência da mais alta instância judicial estava na mira deste juiz nascido no Porto, onde se licenciou em Direito. Há quem diga até que era um objectivo de longa data. "O conselheiro Noronha de Nascimento lutou durante 30 anos para alcançar este sonho", disse, com alguma ironia, o juiz da Relação de Lisboa Eurico Reis, um dos desavindos. Opinião partilhada pelo desembargador Rui Rangel, que era secretário-geral da ASJP quando Noronha era presidente e com quem está de relações cortadas: "Hoje deve ser o dia mais feliz da sua vida em termos de preenchimento do seu ego, porque fez todo o percurso para alcançar este sonho."
Os amigos, esses, não pensam da mesma forma e saem em defesa do conselheiro: "É um homem terra-a-terra e tenho a certeza de que não o movem razões pessoais nem ideias preconcebidas de cariz político", reage o presidente da Relação de Guimarães Lázaro Faria, amigo do conselheiro "há mais de 25 anos". O desembargador fala do futuro presidente do STJ como um "homem racional, arejado na mentalidade e uma pessoa de convicções, mas que sabe ouvir". E, de novo, as opiniões entram em conflito. É que Rui Rangel fala do conselheiro, que "conheceu bem", como um homem que "não aceita críticas, que tem uma visão fechada e que não aceita que as suas ideias sejam vencidas".
"Amado ou odiado", o certo é que Noronha do Nascimento vai ser o próximo presidente do STJ e certamente terá agora menos tempo para a mulher e os dois filhos, para se se dedicar à leitura de livros de História, que tanto gosta, à música clássica e para reunir os amigos na casa de Cinfães, com o Douro como cenário, onde gosta de se refugiar para fugir do "bulício da cidade".
Por Inês David Bastos, in DN Online
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