quinta-feira, novembro 02, 2006

Notícias do pacto


Eduardo Dâmaso
(
Editorial Diário de Notícias)

"O acordo para a justiça começa a ter um nível de discussão entre os operadores judiciários e a comunidade académica que, infelizmente, não tem no plano político.

Duas excelentes análises vindas da universidade, uma mais pessimista, outra menos dramática, representam bons diagnósticos daquilo que é o acordo para a justiça assinado pelo PS e PSD. Diz-nos o que lhe falta e, sobretudo, os dois textos funcionam como elementos desaceleradores das imensas expectativas criadas pela assinatura do documento. A mais pessimista é de Nuno Garoupa, professor da Universidade Nova, e está publicada na edição de Novembro da revista Atlân- tico. É um diagnóstico lúcido, que não faz um juízo definitivo e admite que o documento tem pontos positivos. Mas o que aponta de negativo aponta bem: não é uma reforma da justiça, são reformas pontuais na justiça; não muda de paradigma, mas é uma mera readequação do actual modelo aos problemas que os políticos não souberam ou não puderam resolver no passado; tem uma visão excessivamente processual; acrescenta pouco em matéria de administração e organização, bem como na qualificação e formação dos profissionais da justiça.

O outro contributo é do professor Jorge Miranda, em artigo no Público, que apresenta um conjunto de propostas, algumas delas muito centradas na necessidade de credibilização das magistraturas e do seu autogoverno, que deveriam ser escutadas, mais do que pelo poder político, pelos intervenientes no processo de administração da justiça.

De qualquer modo, o tom e o caminho que um e outro indicam são os da necessidade de uma grande prudência na avaliação a fazer e nos passos a dar. O acordo não virá resolver os grandes problemas da justiça - necessita de superar a superficialidade dos princípios gerais nele contidos, daqui para a frente deve centrar-se a análise na sua substância e não tanto nos ganhos políticos de PS ou PSD. E o grande teste estará, desde já, na reordenação do mapa judiciário. Aí perceberemos se o acordo poderá dar o necessário impulso a uma das reformas de que a justiça precisa como de pão para a boca e até onde resistirá a solidez política do contrato. A extinção de comarcas será um dado adquirido numa verdadeira reforma e, até aqui, nem PS nem PSD demonstraram a menor vontade de ouvir falar do assunto. Vamos ver, portanto, até que ponto o pacto vai resistir a uma implacável contabilidade de ganhos e perdas."

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