sábado, novembro 18, 2006

Inspectores do trabalho são vítimas de violência


Inspeccionar um local de trabalho deixou de ser uma actividade segura. A violência física e verbal sobre os inspectores está a aumentar, alerta o inspector-geral Paulo Morgado de Carvalho, frisando que, desde 2005, já se registaram actos de agressão em 17 das 32 delegações regionais da Inspecção-Geral do Trabalho (IGT).

"Nos serviços centrais não tínhamos noção da frequência com que os actos de violência estavam a ocorrer", reconhece Paulo Morgado de Carvalho, em declarações ao DN. Nesse sentido, disse ter sido com estupefacção que viu os resultados de um inquérito revelarem a existência de agressões físicas e verbais em mais de metade das delegações regionais. "Tais actos ocorreram, principalmente, em micro, pequenas e médias empresas, com predominância nas áreas urbanas", explicou. "Os sectores de actividade onde os actos de violência se verificaram são, maioritariamente, a construção civil e o sector dos transportes, embora também tenham sido referenciados outros sectores, nomeadamente a restauração e hotelaria, calçado e confecção de vestuário", especificou o inspector-geral.

Agressões à entrada

Em Leiria, um inspector aguentou as agressões físicas, mas já não suportou o ambiente de violência gerado à porta da empresa que ia inspeccionar, acabando por ser transportado ao hospital com um ataque cardíaco. O caso está em tribunal.

No Barreiro, os inspectores depararam-se, sobretudo, com a tentativa de obstrução ao seu trabalho. Os administradores da empresa nunca se encontravam no local, e os empregados lá se iam encarregando de comunicar algumas ameaças veladas. Depois de várias tentativas, a inspecção ao estaleiro da obra só foi efectuada depois de solicitada a comparência das autoridades policiais, que cercaram completamente o local.

Em São João da Madeira, os inspectores tiveram um problema adicional, para lá das agressões físicas e verbais: os trabalhadores fecharam-nos num barracão durante algumas horas. Este caso encontra-se também em tribunal.

Desobediência aumenta

"Os empregadores entendem que não devem permitir quer o acesso quer o desenvolvimento da acção de inspecção por motivos que desconhecemos", diz Paulo Morgado de Carvalho, lembrando que "mesmo em tribunal, quando estavam a ser julgados, vários patrões ameaçaram os inspectores e, nalguns casos, usaram expressões verbais ofensivas".

Trata-se de um fenómeno novo, admite o inspector-geral, reconhecendo não ter uma explicação para esse aumento da violência. "Neste momento, não há uma reflexão feita que permita encontrar razões. Apenas se constata que aumenta no nosso país e em toda a Europa", disse.

O levantamento da realidade em Portugal surgiu a partir de um alerta das autoridades francesas, que viram morrer dois inspectores no cumprimento da sua missão. Preocupado com o acontecimento, o Comité dos Altos Responsáveis das Inspecções de Trabalho - entidade ligada à Comissão Europeia - criou um grupo de trabalho para avaliar este tipo de violência na União Europeia.

Segundo o inspector-geral, os dados estão ainda a ser estudados e daí deverá resultar um guião que "harmonize as acções a tomar pelas inspecções do trabalho nacionais, de forma a que não se deixe aos inspectores o encargo de suportar, solitariamente, as consequências de tais actos", explicou.

Trabalho incómodo

Ao longo do último ano, os 266 inspectores fizeram mais de 53 mil visitas a cerca de 31 mil estabelecimentos, envolvendo aproximadamente 550 mil trabalhadores. Durante as visitas foram detectadas mais de 12 mil infracções laborais a que corresponderam 16,4 milhões de euros em contra-ordenações, com uma média de 1327 euros por cada infracção. A construção civil foi o sector mais sancionado, com 33,6% das infracções, correspondentes a 7,8 milhões de euros em multas, ou seja, quase metade da verba total.

Por Licínio Lima, in DN Online

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