Alípio Ribeiro
Director nacional da Polícia Judiciária
Nasceu em Vera Cruz, Aveiro, e tem 56 anos
Licenciou-se pela Faculdade de Direito de Lisboa e ingressou no Ministério Público em 1973. Passou por várias comarcas e foi inspector antes de assumir funções de procurador distrital do Porto.
É a primeira entrevista que o director nacional da PJ dá para fazer um balanço dos seis meses iniciais do seu mandato. Cauteloso, Alípio Ribeiro deixa claro que está a pensar numa profunda reestruturação das direcções nacionais da PJ e que a de combate à droga poderá perder autonomia. Apesar dos sucessos na repressão do tráfico internacional, Alípio Ribeiro quer maiores esforços na investigação do mercado interno. Sobre a corrupção, diz que não há nenhum sector a salvo. Ela toca todos os serviços e não faz promessas de resultados imediatos.
A Polícia Judiciária tem condições para fazer o seu trabalho bem?
A Polícia Judiciária possui os meios necessários para desempenhar capazmente as suas tarefas. É evidente que não tem tudo em abundância, mas tem o suficiente. No contexto global das finanças públicas e das restrições conhecidas a PJ não tem sido penalizada. Há uma coisa em relação à PJ que é preciso dizer: uma polícia funciona bem se tem bom factor humano.
A PJ tem esse factor humano e ele tem sido determinante.Isso significa que está satisfeito com o orçamento para 2007? Há alguns meses o orçamento esteve na raiz de um conflito entre a polícia e o Governo?
Espero que não haja esse conflito para o ano. Já chegou! Vamos atingir um número de cem milhões de euros, o que é um bom orçamento e que nos permitirá trabalhar bem.
Em 2007 vai ter de confrontar-se com uma definição de prioridades em matéria de investigação por parte do Parlamento. Tendo em conta esta variável o orçamento é suficiente?
É evidente que este é o orçamento inicial. É evidente também que, perante desafios concretos que possam surgir, creio que haverá sempre a disponibilidade do Governo em criar alguns acréscimos orçamentais para a PJ. É a ideia que tenho neste momento. Nomeadamente em relação a despesas que venham a ser decorrentes da presidência portuguesa da União Europeia.
O Programa de Reforma da Administração Central do Estado (PRACE) propõe o encerramento de alguns departamentos e directorias. Que efeito é que ele vai ter na PJ?
Sobre a aplicação do PRACE na PJ muito tem sido dito. Creio que, neste momento, não há qualquer decisão de encerramento do que quer que seja na PJ. Há algumas propostas que são públicas mas que não traduzem nenhuma decisão política sobre a matéria. Mais importante do que o PRACE é fazer uma lei orgânica que corresponda a uma reestruturação da PJ adequada aos seus fins. Temos uma lei orgânica elaborada antes do diploma de 2000 que definiu novos fins à PJ. Por conseguinte, temos hoje uma organização que não se adequa a esses fins. Temos de fazer uma lei que defina um novo modelo.
Incluindo uma nova implantação territorial?
É evidente que não podemos ter os departamentos tal como eles existem hoje. Os departamentos reproduzem, em pequeno, as direcções nacionais. Não é isso que se quer! O que temos de ter é unidades locais exclusivamente vocacionadas para a investigação e não estruturas onde quase metade dos funcionários são administrativos.
Chegou a hora de evitar a replicação de estruturas?
Evidente! O modelo clássico que a PJ tem, das três direcções centrais, é um modelo ultrapassado porque se traduz eu não queria ser muito duro mas traduz alguma balcanização da investigação.
Porquê?
Porque são estruturas que vivem para dentro de si. Hoje não é possível mais separar as tipologias de crime organizado e não lhes dar um tratamento unitário. A distância que vai do tráfico de estupefacientes à corrupção e ao terrorismo é inexistente. No mundo global, a criminalidade é global e a investigação tem de ser global. Há vinte ou trinta anos essa organização fazia sentido porque a criminalidade estava muito repartida.
Tem de acabar uma certa quintalização?
É um pouco esse sentido. Temos uma PJ que já é especializada. Não podemos criar mais especializações dentro da especialização. É preciso valorizar as direcções que estão no terreno Porto, Lisboa, Coimbra que estão próximas, e dar-lhes autonomia. Por outro lado, no âmbito nacional, como estruturas nacionais talvez só se justifiquem duas áreas, que são as da corrupção e do terrorismo.
Mas o que é que faz com a direcção central de combate à droga?
Nós temos uma actuação a nível internacional, a nível das grandes apreensões marítimas, mas não podemos esquecer que há um mercado interno que é florescente. É preciso investir mais na investigação interna porque a droga continua abundante e a produzir grande dano. É preciso reflectir nisto. Estas coisas não se decidem num mês ou em dois. É preciso ver bem o que se deve fazer. Digamos que como estruturas verdadeiramente autónomas penso que a corrupção e o terrorismo têm razão de ser porque são fenómenos com uma certa tipicidade e especificidade.
O que disse em relação ao combate à droga anuncia uma mudança de estratégia por parte da PJ.
Precisamos de nos concentrar no mercado interno e definir muito bem o relacionamento com as outras polícias que trabalham nesta área. Isto é um problema delicado, central e que tem de ser resolvido.
O diálogo com a PSP não deve estar muito bem depois daquele incidente do sequestro de Setúbal...
Espero que venha a melhorar! Isto é uma questão de segurança interna, é uma questão de Estado que tem de ser resolvida e não será com um discurso egocêntrico de cada uma das polícias. É preciso dar segurança aos cidadãos.
Por Eduardo Dâmaso e Luís Proença, in Diário de Notícias
(Foto: Tiago Lourenço)
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