A diminuição do tempo de férias dos tribunais vai provocar ainda mais atrasos na conclusão dos processos. Os representantes dos juízes, procuradores e funcionários não têm dúvidas de que a redução das férias ao mês de Agosto, Natal e Páscoa não vai trazer benefícios, muito pelo contrário, poderá até prejudicar os níveis de rendimento e produtividade dos intervenientes judiciais. E uma opinião diametralmente oposta à do ministro da Justiça, que continua a defender a decisão governamental, em plena sintonia com o primeiro-ministro, José Sócrates, o que, aliás, esteve na origem de uma vaga de greves, nomeadamente a primeira dos juízes portugueses, em Outubro de 2005.
Todavia, em declarações à VISÃO, Alberto Costa é prudente: «Vigorou um sistema com séculos de rodagem. Agora, vamos passar de 83 dias para 53 dias de paragem. É natural, em todos os sistemas que inovam, existência de alguns problemas iniciais, que serão corrigidos.» O clima de conflito latente entre os magistrados e o poder político, que se arrasta desde a tomada de posse do XVII Governo, não se alterou. O que mudou foi a atitude dos juízes, com a eleição de um novo presidente: António Francisco Martins, o juiz-desembargador de Coimbra, que saltou para a ribalta mediática quando foi sorteado para presidir ao julgamento do ex-secretário de Estado da Saúde, Costa Freire. António Francisco Martins adoptou uma estratégia diferente da do seu antecessor, Baptista Coelho, que nunca deixou de reagir, taco-a-taco, com agressividade, ao que os juízes consideraram ataques directos do Executivo.
Com um programa eleitoral novo, pautado por uma «atitude proactiva», como gosta de a classificar, António Francisco Martins foi eleito, em Março passado. E, tal como prometeu, está a desenvolver uma táctica de antecipação, na resolução dos problemas da Justiça. Em vez de uma lógica reactiva, o presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) está a fazer propostas concretas ao Governo, colocando a batata quente do lado de Alberto Costa. Como refere uma jurista contactada pela VISÃO, o «tempo corre contra o Governo, que tem de apresentar resultados, pois prometeu mudar a face da Justiça». Ora, quase dois anos depois da sua tomada de posse, a situação não se alterou e pode até agravar-se, sobretudo no caso das pendências, nomeadamente no âmbito da acção executiva.
Para António Cluny, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, não há dúvidas: «Está a ocorrer o que se previa, a impossibilidade de conjugação de calendários. Já não estão a ser marcados julgamentos no Tribunal da Boa-Hora, em Lisboa.» Durante a entrevista que concedeu à VISÃO, António Martins avança, in extremis, com uma proposta para fazer o Governo aceitar a fixação das férias judicias entre 15 de Julho e 31 de Agosto. O ministro da Justiça não está, porém, pêlos ajustes. Alberto Costa garantiu à VISÃO que a «lei, aprovada pela Assembleia da República, não será alterada». Ou seja, os tribunais fecham apenas em Agosto, no Natal e na Páscoa. Os magistrados judiciais, conforme admite o juiz-desembargador, já perceberam que «qualquer problema na Justiça recai sobre eles». Assim, o presidente da ASJP prepara-se para apresentar outras propostas, nas áreas da formação, da contingentação processual, da acção executiva e das comissões de serviço, forçando o ministro a revelar a mesma inflexibilidade que tem sido assacada aos magistrados - inverte-se, deste modo, a situação que se verificou no ano passado.
No sector da Justiça, todos os operadores estão preparados para acompanhar ao pormenor o que se vai passar até finais de Setembro. Ninguém se esquece do que o Governo disse, nos primeiros meses do seu mandato, nomeadamente acerca dos juízes, e que provocou um cerrar de fileiras no sector. Os representantes das associações dos juízes, dos magistrados do Ministério Público e dos oficiais de Justiça, em declarações à VISÃO, afirmam que vão passar a pente fino o período em causa, o que dará origem, inevitavelmente, ao primeiro balanço da política governamental para o sector da Justiça. De resto, também o Ministério da Justiça admite apresentar um balanço final, «lá para o fim de Setembro». Mas o mote está dado. Fernando Jorge, do Sindicato dos Funcionários da Justiça, garantiu à VISÃO: «A alteração vai ter um efeito perverso. Houve muitas dificuldades em elaborar os mapas para assegurar as férias.» Na terça-feira, 4, o ministro da Justiça esteve reunido com o Conselho Superior de Magistratura (CSM), para debater o novo mapa judicial, a futura lei orgânica do CSM e as consequências do processo de Bolonha na formação dos juízes. Aparentemente, as férias judiciais não foram abordadas, durante o encontro, o que pode ser entendido como o surgimento de um novo tabu, na Justiça. De facto, ainda antes da conclusão do parecer sobre o novo mapa, que encomendou ao Observatório da Justiça, devendo ficar concluído no final de Julho, o ministro tem concentrado as suas últimas declarações públicas nesta matéria.
Um especialista contactado pela VISÃO recordou: «É de temer que o estudo não sirva para fundamentar, mas para justificar uma decisão política já tomada.» De facto, não é a primeira vez que o ministro encomenda um trabalho ao Observatório de Coimbra. No ano passado, outro estudo foi elaborado por este organismo, a propósito do volume de trabalho e do desempenho dos tribunais cíveis, que mereceu duras críticas do vice-presidente do CSM, António Bernardino. Aliás, em Dezembro próximo, o Observatório da Justiça também terá de ter concluída outra encomenda do Ministério: a avaliação da acção executiva e propostas para a respectiva solução. Nesse momento, o caso das férias judiciais já estará em fase de rescaldo, que pode fazer deste Verão o mais polémico de sempre na Justiça.
Por Rui Costa Pinto, in "Visão" em 6 de Julho de 2006
via Ordem dos Advogados
Todavia, em declarações à VISÃO, Alberto Costa é prudente: «Vigorou um sistema com séculos de rodagem. Agora, vamos passar de 83 dias para 53 dias de paragem. É natural, em todos os sistemas que inovam, existência de alguns problemas iniciais, que serão corrigidos.» O clima de conflito latente entre os magistrados e o poder político, que se arrasta desde a tomada de posse do XVII Governo, não se alterou. O que mudou foi a atitude dos juízes, com a eleição de um novo presidente: António Francisco Martins, o juiz-desembargador de Coimbra, que saltou para a ribalta mediática quando foi sorteado para presidir ao julgamento do ex-secretário de Estado da Saúde, Costa Freire. António Francisco Martins adoptou uma estratégia diferente da do seu antecessor, Baptista Coelho, que nunca deixou de reagir, taco-a-taco, com agressividade, ao que os juízes consideraram ataques directos do Executivo.
Com um programa eleitoral novo, pautado por uma «atitude proactiva», como gosta de a classificar, António Francisco Martins foi eleito, em Março passado. E, tal como prometeu, está a desenvolver uma táctica de antecipação, na resolução dos problemas da Justiça. Em vez de uma lógica reactiva, o presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) está a fazer propostas concretas ao Governo, colocando a batata quente do lado de Alberto Costa. Como refere uma jurista contactada pela VISÃO, o «tempo corre contra o Governo, que tem de apresentar resultados, pois prometeu mudar a face da Justiça». Ora, quase dois anos depois da sua tomada de posse, a situação não se alterou e pode até agravar-se, sobretudo no caso das pendências, nomeadamente no âmbito da acção executiva.
Para António Cluny, presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, não há dúvidas: «Está a ocorrer o que se previa, a impossibilidade de conjugação de calendários. Já não estão a ser marcados julgamentos no Tribunal da Boa-Hora, em Lisboa.» Durante a entrevista que concedeu à VISÃO, António Martins avança, in extremis, com uma proposta para fazer o Governo aceitar a fixação das férias judicias entre 15 de Julho e 31 de Agosto. O ministro da Justiça não está, porém, pêlos ajustes. Alberto Costa garantiu à VISÃO que a «lei, aprovada pela Assembleia da República, não será alterada». Ou seja, os tribunais fecham apenas em Agosto, no Natal e na Páscoa. Os magistrados judiciais, conforme admite o juiz-desembargador, já perceberam que «qualquer problema na Justiça recai sobre eles». Assim, o presidente da ASJP prepara-se para apresentar outras propostas, nas áreas da formação, da contingentação processual, da acção executiva e das comissões de serviço, forçando o ministro a revelar a mesma inflexibilidade que tem sido assacada aos magistrados - inverte-se, deste modo, a situação que se verificou no ano passado.
No sector da Justiça, todos os operadores estão preparados para acompanhar ao pormenor o que se vai passar até finais de Setembro. Ninguém se esquece do que o Governo disse, nos primeiros meses do seu mandato, nomeadamente acerca dos juízes, e que provocou um cerrar de fileiras no sector. Os representantes das associações dos juízes, dos magistrados do Ministério Público e dos oficiais de Justiça, em declarações à VISÃO, afirmam que vão passar a pente fino o período em causa, o que dará origem, inevitavelmente, ao primeiro balanço da política governamental para o sector da Justiça. De resto, também o Ministério da Justiça admite apresentar um balanço final, «lá para o fim de Setembro». Mas o mote está dado. Fernando Jorge, do Sindicato dos Funcionários da Justiça, garantiu à VISÃO: «A alteração vai ter um efeito perverso. Houve muitas dificuldades em elaborar os mapas para assegurar as férias.» Na terça-feira, 4, o ministro da Justiça esteve reunido com o Conselho Superior de Magistratura (CSM), para debater o novo mapa judicial, a futura lei orgânica do CSM e as consequências do processo de Bolonha na formação dos juízes. Aparentemente, as férias judiciais não foram abordadas, durante o encontro, o que pode ser entendido como o surgimento de um novo tabu, na Justiça. De facto, ainda antes da conclusão do parecer sobre o novo mapa, que encomendou ao Observatório da Justiça, devendo ficar concluído no final de Julho, o ministro tem concentrado as suas últimas declarações públicas nesta matéria.
Um especialista contactado pela VISÃO recordou: «É de temer que o estudo não sirva para fundamentar, mas para justificar uma decisão política já tomada.» De facto, não é a primeira vez que o ministro encomenda um trabalho ao Observatório de Coimbra. No ano passado, outro estudo foi elaborado por este organismo, a propósito do volume de trabalho e do desempenho dos tribunais cíveis, que mereceu duras críticas do vice-presidente do CSM, António Bernardino. Aliás, em Dezembro próximo, o Observatório da Justiça também terá de ter concluída outra encomenda do Ministério: a avaliação da acção executiva e propostas para a respectiva solução. Nesse momento, o caso das férias judiciais já estará em fase de rescaldo, que pode fazer deste Verão o mais polémico de sempre na Justiça.
Por Rui Costa Pinto, in "Visão" em 6 de Julho de 2006
via Ordem dos Advogados
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