segunda-feira, fevereiro 12, 2007

A investigação


Por André Macedo
(in Diário Económico)

"A cooperação entre polícias e organismos que investigam em nome do Estado deveria ser tão natural como pesquisar no google.

Uma ponta ligada à outra: uma pergunta aparecia aqui, a resposta saia ali. O motor da justiça a funcionar em pleno. Acontece que, em Portugal, cada um trabalha para o seu lado. Cada um faz a sua investigaçãozinha e chega às suas conclusões extraordinárias. O Ministério Público puxa para um lado. A PJ para o outro. O Fisco para outro ainda. Dentro de cada um destes organismos há muitas outras correntes e facções que enfraquecem aquilo que deveria ser forte e quase indivisível.

Apesar desta divisão, Portugal é o país dos mega-processos. É a pátria dos processos monumentais que crescem como castelos de areia e, um dia, ameaçam ruir como baralhos de cartas. Casa Pia, Apito Dourado, Operação Furacão – se já é difícil investigar, julgar e condenar uma pessoa, multiplicar o caso por dezenas de arguidos e crimes ao mesmo tempo é um trabalho gigantesco. A verdade está à vista: a justiça portuguesa é individualista e tem mais olhos do que barriga. Não lhe basta uma suspeita, quer um magote. O fracasso dos processos é o fruto podre deste autismo.

É por isso que a recente coordenação entre PJ e Fisco é tão importante. O que deveria acontecer há muito tempo, começa agora a decorrer com eficácia e discrição. O cruzamento de informações decorre normalmente, sem invejas, livre de protagonismos e egos inchados. Paulo Macedo (Fisco) e Alípio Ribeiro (PJ) sabem que, sozinhos, conseguem pouco. Juntos podem ir infinitamente mais longe.

A fuga ao fisco é o fio que pode ajudar a puxar este novelo. Na falta de cadáver, a evasão e fuga fiscais são o primeiro sinal de que nem tudo está bem. O dinheiro que resulta dos crimes e que não aparece nas declarações de impostos é o rasto que levanta a suspeita. O Fisco está atento a estas manifestações de riqueza, mas a a detecção é apenas o primeiro passo. A seguir vem o trabalho de investigação da PJ. O que nasce como crime fiscal acaba por denunciar outros crimes de natureza mais perigosa. Com uma economia paralela calculada em 22% do PIB há muito para fazer e descobrir.

Claro, nem tudo cai no âmbito do Código Penal. E o que não pertence deve seguir o seu caminho. Por exemplo, nem todos os maus negócios das autarquias são crime. Nem tudo é um caso de polícia. A investigação – com especial responsabilidade para o Ministério Público – deve ter a capacidade para separar as águas. Deve ter capacidade para resistir ao circo mediático. Os tribunais administrativos devem julgar estes processos e, se for caso disso, anular estes negócios. Há uma enorme diferença entre ser ladrão ou ser incompetente. Hoje parecem a mesma coisa. Não são. A justiça e a política também são coisas diferentes."

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