terça-feira, janeiro 16, 2007

A velha ordem do crime


Por António José Teixeira
(Editorial Diário de Notícias)

"Em tempo de forca tendemos a olhar o combate ao terrorismo como pura guerra convencional. É assim desde que três aviões deitaram por terra boa parte da sempre débil segurança mundial. Continua a ser assim desde a invasão do Iraque. Volta a ser assim com a mobilização de 21 500 soldados americanos para o atoleiro babilónico. O terrorismo é uma ameaça crescente. Não deve ser desvalorizada. E é por isso que não podemos julgar que o mundo se tornará menos perigoso apenas porque se acrescentam soldados à guerra civil iraquiana. Ou que bastará exigir aos estrangeiros que pretendam entrar nos EUA dez impressões digitais para que os terroristas desistam dos seus intentos. É o que pensa Michael Chertoft, secretário americano para a Segurança Interna. "Vamos ter um mundo onde qualquer terrorista vai questionar-se: 'Será que deixei alguma impressão digital?' E isso vai deixá-los malucos!" Irá? Não será importante tentar responder a outra pergunta: como é que se vence quem não tem medo de morrer?

O vital combate ao terrorismo precisa de abrir os olhos aos circuitos clandestinos do dinheiro proveniente do branqueamento de capitais, do tráfico de armas, da droga ou da indústria de falsificações. O crime organizado movimenta hoje mais de 10% do comércio mundial. Moisés Naím, director da revista americana Foreign Policy e antigo responsável do Banco Mundial, estuda estas redes clandestinas há 15 anos e conclui que os mercados ilegais estão a crescer a uma velocidade superior à da economia mundial.

A lavagem de dinheiro, diz Naím no seu último livro, Ilícito, multiplicou-se por dez desde 1990 e representa hoje entre um e 1,5 biliões de dólares. Isto enquanto o comércio legítimo apenas duplicou no mesmo período: de cindo a dez biliões de dólares. Em entrevista ao El País, Moisés Naím cita um caso para se perceber até que ponto os tentáculos desta rede global chegam aos pontos mais sensíveis da segurança mundial. O engenheiro Abdul Qader Khan, responsável pelo projecto nuclear paquistanês nos anos 90, vendeu tecnologia e maquinaria. Com cumplicidades oficiais, a tecnologia nuclear paquistanesa chegou à Coreia do Norte e ao Irão.

O combate às redes clandestinas que alimentam o terrorismo está quase integralmente por fazer. Talvez por se confundir quantas vezes com interesses económicos e políticos mais fortes do que a retórica dos bons costumes. A denúncia de Moisés Naím apenas nos deixa mais conscientes da insegurança global. E não serão os anunciados 21 500 soldados que a irão diminuir. Tragicamente, pelo contrário."

Sem comentários: