terça-feira, janeiro 23, 2007

Juízes solidários com Advogados mal pagos


O presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP), António Martins, criticou, em declarações ao JN, os atrasos por parte do Estado no pagamento aos advogados oficiosos e que levou ontem ao boicote de 40 desses profissionais, em Sintra, em mais uma sessão do chamado "Processo do Álcool", numa forma de protesto inédita, com os causídicos a recusarem-se a entrar na sala de audiências.

Tal como o JN noticiou no sábado, os 40 advogados estão há 10 meses sem receber os honorários e as despesas e admitiam vir a boicotar uma das sessões do megaprocesso. Os advogados acabaram ontem de manhã por levar a cabo o protesto, vestindo a toga mas mantendo-se à porta do tribunal de Sintra. O presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados, Raposo Subtil, esteve também no local.

A não comparência dos causídicos na sala de audiências obrigou a juíza-presidente a convocar juristas de escala e a solicitar aos outros advogados do processo para assumirem a defesa dos arguidos que tinham ficado sem defensor, o que não foi aceite por todos. Os advogados voltaram a assumir as funções já depois de almoço e o presidente da ASJP alerta para o facto de "haver outros casos". "Não é apenas o de Sintra, tal como tem sido divulgado pela Comunicação Social", afirmou. António Martins diz que se trata de uma "situação lamentável que só não tem consequências" na eficácia da defesa "pelo grande profissionalismo que é revelado pelos advogados". O JN contactou a Ordem dos Advogados para saber qual o número de causídicos que estão com verbas em atraso, mas tal não foi possível.

No entanto, o anterior bastonário José Miguel Júdice adiantou ao JN que esta "é uma situação recorrente. Na altura conseguimos negociar um reforço orçamental com o Ministério da Justiça e deixei pronto um projecto de revisão do regime de apoio judiciário que ainda não foi aplicado". José Miguel Júdice lembra ter chegado a deslocar-se "pessoalmente junto de advogados para evitar que pudessem tomar qualquer atitude".

O Ministério da Justiça vai entretanto garantir o pagamento das verbas na "primeira semana de Fevereiro" e justifica o caso como "uma disfunção no sistema informático". O Ministério da Justiça adiantou ao JN que o pedido de demissão do presidente do Instituto de Gestão Financeira e Patrimonial da Justiça, responsável pelos pagamentos, é anterior a este caso. "Foi por razões profissionais e pessoais" disse. A mesma versão que foi veiculada ao JN por aquele responsável.

Da toga para o balcão de peças

Nuno Entradas é um dos muitos advogados que vivem dias dramáticos com a falta de pagamento.Desde 2004, altura em que concluiu Direito, que entrou nas escalas e começou a fazer as defesas oficiosas no tribunal de Beja. Com uma vida atrás de um balcão, como caixeiro de peças, lutou para ser advogado, conseguiu, mas continua a vender peças, porque o dinheiro do Estado não aparece. "Recebi uns 500 euros. Há em atraso cerca de três mil", diz este jovem de 29 anos. Casimiro Heitor, presidente da Delegação de Beja da Ordem dos Advogados, reconhece "os honorários em atraso e a acção do bastonário para resolver o problema", não quantificando verbas nem o número de juristas prejudicados.


Por Carlos Varela e Teixeira Correia, in Jornal de Notícias.

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