Manuel Metello
Nasceu em 1929
Licenciado em Direito
Vive em Lisboa, mas já foi emigrante no Brasil
Foi advogado da Associação Lisbonense de Proprietários e hoje é o seu presidente
Ao fim de um ano da entrada em vigor da nova lei do arrendamento, que balanço faz? O mercado está ou não mais dinâmico?
Não há mercado. A lei não funciona. Foi uma lei feita em 100 dias, em cima do joelho e o seu anúncio foi tão demagógico quanto "eleitoreiro". Apresentou-se como a solução para a degradação imobiliária e o relançamento do mercado de arrendamento e nada, mesmo nada disso, está a andar. Avançaram com esta reforma sem uma palavra sobre os apoios à reabilitação.
Quais são os principais bloqueios?
O bloqueio é geral. Mas vamos começar pelo obstáculo das comissões arbitrais municipais (CAM). Temos 308 concelhos e desses talvez uns 30 ou 40 municípios já tenham constituído as CAM. Mas só cerca de uma dezena é que estão efectivamente a funcionar. Porque a lei estabelece que as CAM sejam constituídas, em cada concelho, por um elemento da autarquia, e representantes das ordens dos engenheiros, arquitectos e ainda representantes dos inquilinos e dos senhorios. O problema é definir quem é que representa quem em cada concelho. Nós, na associação, recebemos notificações de todas as câmaras do País para indicarmos os representantes na região. Mas eu não posso saber quem representa os proprietários em Freixo de Espada à Cinta.
Esse é um dos principais problemas para a operacionalização da lei?
É seguramente um dos maiores problemas. Desde o início que critiquei esse modelo, pela sua difícil operacionalização, mas agora não há nada a fazer. Isto tem de andar. Ainda fiz tentativas de pedir às finanças os nomes dos maiores proprietários nos concelhos, mas revelou-se muito difícil encontrar essas pessoas, ou porque não moravam ali, ou porque já tinham muita idade, enfim. O que estamos a fazer é designar pessoas habilitadas que nós conhecemos para Lisboa, Santarém ou Setúbal. Qualquer proprietário que queira actualizar as rendas antigas tem de recorrer à CAM, mas se não existir uma CAM devidamente constituída no concelho, não pode iniciar o processo.
Tem havido muitas reclamações?
Sim, estamos neste processo em que os técnicos vão a casa, apontam necessidade de obras, às vezes não referentes ao imóvel, mas à entrada do prédio, etc. Depois o proprietário não sabe, porque a lei não diz, se depois de fazer a obra é o mesmo técnico que lá vai ou vem outro, e abre-se o processo novamente, sujeito aos seus critérios. Porque, afinal, os critérios são muito subjectivos. Isto é tudo de difícil aplicação.
No final de Junho deste ano só tinham sido actualizadas cerca de 70 rendas antigas, num universo de 400 mil rendas desajustadas. Esta é a dimensão do "fracasso"?
É um fracasso. Estou convencido de que a lei não vai singrar.
Porque tem um pessimismo tão categórico?
A burocracia para os proprietários é muito grande, só para se poderem candidatar à actualização da renda. Mas isto não fica aqui, pois ainda vão ter de pagar mais Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI). E há ainda a probabilidade de não serem autorizados a aumentar as rendas, mas serem, mesmo assim, intimados a fazer obras. E o que se nota é que os proprietários estão a ficar cansados. Porque como é que se obrigam senhorios descapitalizados a fazer obras, se não existem instrumentos ágeis de financiamento a fundo perdido, que estavam previsto desde o Recria? Foi prometido desde o Governo do Durão Barroso, depois pelo Luís Arnault e até agora não há uma palavra.
Mas existem programas de juros bonificados.
Sim, mas a burocracia é desencorajante. Por outro lado, esses programas apostam no endividamento dos proprietários, que têm de recorrer à banca. Ora, o próprio Recria reconhecia, nos seus fundamentos, que esse era um ónus do Estado, porque se as casas estão degradadas, esse é o resultado de décadas de congelamento.
Está a dizer que esta lei, que nasceu supostamente para repor alguma justiça e equilíbrio ao mercado do arrendamento, está a penalizar os proprietários?
Os senhorios estão a ser penalizados. Porque a maioria só pode fazer obras de pequeno porte. Para as de grande dimensão, que envolvem as estruturas dos prédios, não têm dinheiro.
Então como fazem os aumentos das rendas?
Nós estamos a aconselhar os nossos sócios a fazerem acordos directos com os inquilinos para poderem aumentar as rendas. As associações de inquilinos dizem que isto é contornar a lei, mas quando a lei é má...Temos de tirar partido de uma das coisas mais importantes desta nova lei , que é o princípio da liberdade contratual. Hoje - ao contrário de outros tempos em que o contrato estava congelado -, os senhorios e inquilinos têm plena liberdade contratual. Em vez de passar pelo processo das avaliações e dos aumentos faseados em cinco anos, fazemos um acordo em que fica estipulado o gradualismo da renda, se a casa tiver em condições. Se a casa não estiver, o inquilino não é obrigado nem tem de responder à carta.
Então há uma vantagem na nova lei?
Essa é uma vantagem.
Mesmo céptico, quando é que espera que os efeitos desta lei se comecem a fazer notar, tanto nos rendimentos dos senhorios como no dinamismo do mercado?
Sinceramente, ou mexem na lei ou para o ano estamos na mesma. Na lentidão, na indefinição e na insegurança. Os proprietários que aguentaram estes anos todos e viram na mudança da lei uma oportunidade estão cansados. Porque nada poderá funcionar, sem que os tribunais funcionem, de modo a dar confiança a quem arrenda. Muitos vão vender. E vejo abutres, grupos financeiros, a pairar sobre a cidade e com capacidade para esperar anos até que o inquilino ou o proprietário morra.
Que hipóteses há de esta lei ser alterada?
Há uma iniciativa nova, a "Portas 65", uma comissão nomeada pelo Governo e constituída pelo arquitecto Portas - o famoso da "Lei Portas" - e o economista Augusto Mateus, que vai fazer o acompanhamento da lei. Fiquei bem impressionado, porque eles têm muita consciência dos problemas e percebem que a lei tem entraves. A comissão prevê a possibilidade de mexidas na lei.
Nasceu em 1929
Licenciado em Direito
Vive em Lisboa, mas já foi emigrante no Brasil
Foi advogado da Associação Lisbonense de Proprietários e hoje é o seu presidente
Ao fim de um ano da entrada em vigor da nova lei do arrendamento, que balanço faz? O mercado está ou não mais dinâmico?
Não há mercado. A lei não funciona. Foi uma lei feita em 100 dias, em cima do joelho e o seu anúncio foi tão demagógico quanto "eleitoreiro". Apresentou-se como a solução para a degradação imobiliária e o relançamento do mercado de arrendamento e nada, mesmo nada disso, está a andar. Avançaram com esta reforma sem uma palavra sobre os apoios à reabilitação.
Quais são os principais bloqueios?
O bloqueio é geral. Mas vamos começar pelo obstáculo das comissões arbitrais municipais (CAM). Temos 308 concelhos e desses talvez uns 30 ou 40 municípios já tenham constituído as CAM. Mas só cerca de uma dezena é que estão efectivamente a funcionar. Porque a lei estabelece que as CAM sejam constituídas, em cada concelho, por um elemento da autarquia, e representantes das ordens dos engenheiros, arquitectos e ainda representantes dos inquilinos e dos senhorios. O problema é definir quem é que representa quem em cada concelho. Nós, na associação, recebemos notificações de todas as câmaras do País para indicarmos os representantes na região. Mas eu não posso saber quem representa os proprietários em Freixo de Espada à Cinta.
Esse é um dos principais problemas para a operacionalização da lei?
É seguramente um dos maiores problemas. Desde o início que critiquei esse modelo, pela sua difícil operacionalização, mas agora não há nada a fazer. Isto tem de andar. Ainda fiz tentativas de pedir às finanças os nomes dos maiores proprietários nos concelhos, mas revelou-se muito difícil encontrar essas pessoas, ou porque não moravam ali, ou porque já tinham muita idade, enfim. O que estamos a fazer é designar pessoas habilitadas que nós conhecemos para Lisboa, Santarém ou Setúbal. Qualquer proprietário que queira actualizar as rendas antigas tem de recorrer à CAM, mas se não existir uma CAM devidamente constituída no concelho, não pode iniciar o processo.
Tem havido muitas reclamações?
Sim, estamos neste processo em que os técnicos vão a casa, apontam necessidade de obras, às vezes não referentes ao imóvel, mas à entrada do prédio, etc. Depois o proprietário não sabe, porque a lei não diz, se depois de fazer a obra é o mesmo técnico que lá vai ou vem outro, e abre-se o processo novamente, sujeito aos seus critérios. Porque, afinal, os critérios são muito subjectivos. Isto é tudo de difícil aplicação.
No final de Junho deste ano só tinham sido actualizadas cerca de 70 rendas antigas, num universo de 400 mil rendas desajustadas. Esta é a dimensão do "fracasso"?
É um fracasso. Estou convencido de que a lei não vai singrar.
Porque tem um pessimismo tão categórico?
A burocracia para os proprietários é muito grande, só para se poderem candidatar à actualização da renda. Mas isto não fica aqui, pois ainda vão ter de pagar mais Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI). E há ainda a probabilidade de não serem autorizados a aumentar as rendas, mas serem, mesmo assim, intimados a fazer obras. E o que se nota é que os proprietários estão a ficar cansados. Porque como é que se obrigam senhorios descapitalizados a fazer obras, se não existem instrumentos ágeis de financiamento a fundo perdido, que estavam previsto desde o Recria? Foi prometido desde o Governo do Durão Barroso, depois pelo Luís Arnault e até agora não há uma palavra.
Mas existem programas de juros bonificados.
Sim, mas a burocracia é desencorajante. Por outro lado, esses programas apostam no endividamento dos proprietários, que têm de recorrer à banca. Ora, o próprio Recria reconhecia, nos seus fundamentos, que esse era um ónus do Estado, porque se as casas estão degradadas, esse é o resultado de décadas de congelamento.
Está a dizer que esta lei, que nasceu supostamente para repor alguma justiça e equilíbrio ao mercado do arrendamento, está a penalizar os proprietários?
Os senhorios estão a ser penalizados. Porque a maioria só pode fazer obras de pequeno porte. Para as de grande dimensão, que envolvem as estruturas dos prédios, não têm dinheiro.
Então como fazem os aumentos das rendas?
Nós estamos a aconselhar os nossos sócios a fazerem acordos directos com os inquilinos para poderem aumentar as rendas. As associações de inquilinos dizem que isto é contornar a lei, mas quando a lei é má...Temos de tirar partido de uma das coisas mais importantes desta nova lei , que é o princípio da liberdade contratual. Hoje - ao contrário de outros tempos em que o contrato estava congelado -, os senhorios e inquilinos têm plena liberdade contratual. Em vez de passar pelo processo das avaliações e dos aumentos faseados em cinco anos, fazemos um acordo em que fica estipulado o gradualismo da renda, se a casa tiver em condições. Se a casa não estiver, o inquilino não é obrigado nem tem de responder à carta.
Então há uma vantagem na nova lei?
Essa é uma vantagem.
Mesmo céptico, quando é que espera que os efeitos desta lei se comecem a fazer notar, tanto nos rendimentos dos senhorios como no dinamismo do mercado?
Sinceramente, ou mexem na lei ou para o ano estamos na mesma. Na lentidão, na indefinição e na insegurança. Os proprietários que aguentaram estes anos todos e viram na mudança da lei uma oportunidade estão cansados. Porque nada poderá funcionar, sem que os tribunais funcionem, de modo a dar confiança a quem arrenda. Muitos vão vender. E vejo abutres, grupos financeiros, a pairar sobre a cidade e com capacidade para esperar anos até que o inquilino ou o proprietário morra.
Que hipóteses há de esta lei ser alterada?
Há uma iniciativa nova, a "Portas 65", uma comissão nomeada pelo Governo e constituída pelo arquitecto Portas - o famoso da "Lei Portas" - e o economista Augusto Mateus, que vai fazer o acompanhamento da lei. Fiquei bem impressionado, porque eles têm muita consciência dos problemas e percebem que a lei tem entraves. A comissão prevê a possibilidade de mexidas na lei.
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