sábado, abril 28, 2007

Governo extingue "local de trabalho" de 47 juízes

Sindicatos falam em manipulação de números

O Governo vai extinguir sectores da justiça onde trabalham 47 juízes, deixando-os sem tribunal para trabalhar a partir de 1 Setembro. Estes magistrados vão ser deslocados para 18 novos sectores já anunciados, três dos quais devem estar criados naquela mesma data, mas, mesmo assim, 29 vão ficar na "prateleira" - na chamada "bolsa de juízes" a assegurar substituições urgentes. Os sindicatos do sector dizem não encontrar explicação para esta iniciativa inédita do Executivo.

O Ministério da Justiça (MJ) justifica esta mexida por achar que há tribunais com trabalho a mais e outros a menos, e apresenta números que, em sua óptica, fundamentam uma "urgente" racionalização dos recursos. Mas, os magistrados e funcionários judiciais contestam a iniciativa, "sobretudo nesta altura", lembrando que está em curso a reforma do mapa judiciário. Quanto aos números, não afirmam que sejam manipulados, mas garantem que são "virtuais", "não verdadeiros", e "não correspondentes com a realidade".

Entre os sectores a extinguir a 1 de Setembro, conta-se varas criminais, juízos de tribunais e família e menores, de trabalho e outros. Em contrapartida, o Governo anunciou a criação de 18 novos lugares, três dos quais naquela data. Assim, vão estar 44 juízes, não se sabe até quando, a aguardar um lugar de trabalho. Entre esses, 29 sabem que os seu destino será a "bolsa". Ou seja, trabalham quando houver doentes, grávidas ou outras situações de urgência.

Os magistrados e funcionários judicias estão indignados. A Associação Sindical de Juízes Portugueses (ASJP), em parecer enviado ao Governo, já fez saber, por um lado, que a avaliação de carga de serviço nos tribunais a extinguir se baseou numa leitura acrítica dos números estatísticos. "A leitura automática da estatística não coincide com a realidade".

Por outro lado, "não tem qualquer racionalidade deixar 44 juízes sem lugar de quadro, dezenas de tribunais sem aumento de capacidade de resposta e mais de 67 mil processos que terão de ser redistribuídos, desperdiçando o conhecimento que os actuais juízes titulares têm desse serviço", salienta a ASJP.

Também o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP) se mostrou indignado. Além de o Governo omitir completamente estes magistrados da resolução aprovada em conselho de ministros a 24 de Abril, a entidade acusa também o Executivo de assentar a sua proposta no "número de pendência processual". Trata-se de um critério "volátil" e "insensível", frisa. Porque os números estatísticos apresentados não correspondem à realidade. "Um processo estatisticamente findo, com decisão final, pode não estar processualmente findo". Ou seja, mesmo depois de existir uma decisão final, muitas outras acções se realizam no processo, desde contagem de penas, recursos, mandados de libertação e muitas outras diligências, lembra o SMMP.

O Governo, segundo os sindicatos dos magistrados e dos funcionários, teve em conta, apenas, a pendência estatística, a que refere processos findos, e não a real. Com este critério, é justificado, nomeadamente, o encerramento da 9.ª Vara do Tribunal da Boa-Hora. Trata-se de uma das mais emblemáticas, onde correram vários megaprocessos, como o da Moderna, por exemplo. O MJ diz que ali existem apenas 210 processos pendentes. Porém, segundo os dados do tribunal, a Vara tem em tramitação 1017 nas três secções. Entre estes encontram-se alguns mediáticos, como por exemplo, o caso das funcionárias da Procuradoria-Geral da República, ou o do médico que burlou a ADSE. Acabou de entrar outro com 50 arguidos.

Para o Sindicato dos Funcionários Judiciais, a "esta proposta mais não é do que puxar a manta para um lado, destapando o outro".

Por Licínio Lima, in
DN Online.
(aspas no título nossas)

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