segunda-feira, agosto 06, 2007

Justiça trava acesso dos notários a registos prediais

Notários pagaram 20 milhões, mas ainda não têm acesso a registos civis, prediais e comerciais.


Os notários já pagaram, desde Fevereiro de 2005, mais de 20 milhões de euros pelo acesso a uma base de dados do Ministério da Justiça, mas até agora o ministro ainda não lhes permitiu o acesso aos elementos que estão nessa base de dados.

Em causa está o acesso dos notários à base de dados de que o Ministério da Justiça dispõe dos registos civil, comercial e predial, uma promessa feita por Alberto Costa quando os notários foram privatizados, em 2005, altura em que consequentemente, perderam o acesso directo a essa informação. Esses dados são fundamentais para os notários, por exemplo numa escritura pública de compra de casa, acederem às características do imóvel, incluindo o seu proprietário.

A informação sobre o pagamento de 7 milhões de euros, em 2005, e de mais 13 milhões em 2006 (falta ainda contabilizar os montantes deste ano) foi avançada ao Diário Económico pelo bastonário da Ordem dos Notários, Joaquim Barata Lopes.

Esse pagamento já foi feito mas, até agora, “os notários esperam ainda que o Governo lhes conceda a ‘password’ de acesso a esse serviço”, explicou Barata Lopes. Indignada com “a negligência do Governo”, a instituição sugeriu aos notários que enviassem uma carta ao ministro, o que foi feito a 24 de Julho.

A iniciativa “uma carta ao ministro por cada notário”, serviu como uma acção de protesto, mas até agora o Ministério não deu qualquer resposta.

O DE tentou questionar o Ministério de Alberto Costa mas, até ao fecho desta edição, não conseguiu obter resposta.

Num contexto em que as relações entre a actual Ordem dos Notários e o Executivo estão cada vez mais tensas – Barata Lopes chega a falar em “perseguição pública aos notários” – a discussão ganhou contornos ainda mais polémicos depois de o próprio Governo ter autorizado o acesso gratuito e imediato dessa mesma base de dados dos registos do Ministério da Justiça às instituições de crédito.

“É do conhecimento geral que a lei prevê o acesso dos notários a tais bases de dados, no entanto o Estado tem vindo a cobrar desde sempre um serviço que nunca disponibilizou”, lamentou Barata Lopes.

Esta é já a segunda tentativa da Ordem. Em Abril deste ano, os notários solicitaram “em carta dirigida ao Ministro da Justiça em 23 de Abril tal acesso [à ‘password’ de acesso aos registos dos contribuintes] sem, no entanto, ter obtido qualquer resposta”. Por isso, Barata Lopes é peremptório: “solicito o envio imediato da chave de acesso que me permita consultar as bases de dados dos registos, nos termos da lei”, diz o bastonário da classe.

Desde Março de 20006, quando tomou posse, que Barata Lopes tem vindo a reclamar do Governo um conjunto de medidas para manter a importância dos notários.

Justiça ignora remédios da Concorrência

Um ano e meio depois da Autoridade da Concorrência (AdC) ter recomendado ao Governo um conjunto de medidas para atenuar as práticas anticoncorrenciais que decorrem da privatização dos notários, essas medidas ainda estão por cumprir. Em causa estavam problemas de falta de concorrência relacionados com o tabelamento de preços, falta de oferta de notários em termos geográficos e eventuais barreiras à entrada de novos operantes. No âmbito deste processo, a AdC chegou a fazer várias visitas a instalações notariais do país. Admitindo que foi chamado a responder à AdC, no início de 2006, o bastonário dos Notários, Barata Lopes, disse que foi, sobretudo, questionado “sobre o facto de os preços serem tabelados [por portaria do Governo] e sobre o facto de não existirem mais notários do que aqueles que o Estado determinou. A privatização dos notários está, aliás, também por completar: ainda existem em Portugal cerca de 150 cartórios públicos, de um total de mais de 500, o que significa que o número de cartórios privatizados ficou-se pelos 350."

Notários e Governo, uma relação conflituosa

Logo no primeiro Congresso dos Notários, em Maio de 2006, percebeu-se que as relações entre o Ministério da Justiça e os notários não iam ser fáceis. Em causa estava a reforma preparada pelo ministro Alberto Costa, principalmente no que diz respeito à exclusão dos notários de actos, o que poderia pôr em perigo a legalidade. “O Ministério da Justiça continua sem perceber que a simplificação dos actos sem perda de quaisquer garantias, designadamente de segurança jurídica, é feita também e, sobretudo, com a intervenção dos notários”, sublinhou o bastonário dos notários, Barata Lopes. ”Este é o aspecto fundamental, o erro em que lavra o ministro da Justiça”. Alberto Costa respondeu, lembrando que as medidas de simplificação administrativa foram preparadas com “activa colaboração das associações empresariais”, tendo sido montados e “reforçados os mecanismos de fiscalização e de acompanhamento”, bem como de ”cruzamento de dados” com várias entidades, como o Ministério das Finanças. A solução, defendeu o ministro, passa por os notários encontrarem “novos espaçosde intervenção que criem
soluções de valor acrescentado para o cidadão e empresas”.


Por Joana Moura e Filipa Ambrósio de Sousa, in
Diário Económico.

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