segunda-feira, agosto 23, 2010

A privatização das polícias

Por PAULO PEREIRA DE ALMEIDA

(in DN Online)


"Quem tem estado atento a algumas mudanças na segurança interna portuguesa nas últimas semanas pôde constatar dois sinais - aparentemente contraditórios - na definição das fronteiras da tutela no Ministério da Administração Interna (MAI).

O primeiro destes sinais - e como noticiou oportunamente o DN - prende-se com o facto de os guardas nocturnos já poderem andar armados durante o serviço com "armas de defesa pessoal, pistola ou revólver, depois de frequentarem o Curso de Formação Técnica e Cívica da PSP". Uma decisão curiosa, atendendo à circunstância de - no caso dos outros seguranças privados - se tratar ainda de uma questão bastante polémica. Criam--se assim dois estatutos que, em meu entender, são a demonstração da necessidade de existência de uma melhor regulação no sector da segurança privada. É que - claro está -, independentemente dos artifícios legais que possam distinguir estes dois tipos de segurança, a verdade é que se trata aqui de duas formas de segurança privada. O outro sinal refere-se a um aparente desperdício de recursos. É que - e também segundo o que o DN apurou - o País ficou esta semana a saber que existem cerca de 300 elementos da extinta Polícia Florestal (PF), "com elevado conhecimento científico e técnico sobre fogos florestais, que continuam sem ser aproveitados". E, de facto, quando estes profissionais de segurança passaram a integrar o Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR, em 2006, tudo parecia indicar que as suas competências seriam aproveitadas para a investigação de fogos, protecção da floresta e fiscalização da caça e da pesca, sendo que os militares do SEPNA da GNR actuariam primordialmente na área da protecção e fiscalização ambiental. Mas - e apesar do problema nacional do número de incêndios que está a colocar em causa o património ambiental para as gerações futuras - o Governo não parece querer aproveitar este potencial de conhecimento e de acção no terreno.

Para além destes dois sinais - claramente contraditórios e ligados à questão das fronteiras entre os domínios da segurança pública e privada - existe ainda uma outra matéria premente no universo da regulação e da estruturação das competências do MAI: trata-se, concretamente, das polícias municipais (PM). Na realidade, as PM têm vindo a ser criadas e os seus quadros definidos pelas câmaras num ambiente de indefinição: no respeitante a carreiras, vínculos e remunerações, o MAI advoga que compete à Secretaria de Estado da Administração Local (SEAL) legislar e regular estas matérias; simultaneamente, as PM de Lisboa e do Porto têm um estatuto diferenciado das restantes no País, tendo-se criado assim uma situação de desigualdade entre profissionais que deveriam usar a mesma farda. Afinal de contas, todos são PM. A somar a tudo isto, coloca-se também a questão das competências das PM, designadamente na manutenção da ordem pública e, ainda, na investigação criminal: para o cidadão comum, quando se vê um polícia fardado na rua a expectativa é a de estarmos perante um representante da autoridade, com todas as competências inerentes a um polícia, pago pelo Estado de Portugal para a protecção dos contribuintes. É por isso que, a muitos títulos, a luta pela dignificação destes profissionais e da clarificação do seu estatuto me parece justa e de resolução relativamente simples. Assim existam condições políticas e orçamentais para tal."

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