segunda-feira, março 29, 2010

Falta de peritos financeiros na PJ "entope" combate à corrupção

Novo pacote legislativo que está em preparação na AR pode ser comprometido por problema com muitos anos: a demora nas peritagens por escassez de meios.
Comissão Parlamentar está focada na procura de consensos
Comissão Parlamentar está focada na procura de consensos

São muitos e diversificados os problemas no combate à corrupção. Ao longo de quase três meses de trabalho, a comissão parlamentar que analisa o fenómeno já ouviu de tudo sobre as dificuldades. Prepara-se agora para analisar as propostas das cerca de 30 audições e em meados do ano deverá apresentar um novo e importante pacote legislativo. Mas este pode servir para pouco, porque tudo empanca na falta de meios humanos, especialmente na falta de peritos na área financeira e contabilística da PJ.

Procurador-Geral da República, procuradores-gerais adjuntos, directores da Polícia Judiciária e representantes dos investigadores denunciaram o facto de uma forma clara e a uma só voz na comissão parlamentar (...). Os deputados reconhecem o problema, mas empurram a questão para o Governo, que garante que está a reforçar os meios de combate. Mas, para já, não estão previstas admissões de peritos para a área financeira. E a demora das peritagens é considerada pelos responsáveis pela justiça como um dos principais entraves à investigação e que contribui para a prescrição de processos.

"Um filme de terror." Assim classifica o jurista e deputado do PSD Fernando Negrão o que tem ouvido na comissão sobre a falta de meios, especialmente no departamento de perícia financeira. Não é que o facto seja uma novidade para ele, já que no final dos anos noventa foi director da PJ. Mas daí para cá nada parece ter melhorado. Por isso, Fernando Negrão diz esperar que saia da comissão parlamentar, além da elaboração de novos projectos de lei, "a certeza de que o Governo precisa de aumentar os meios de combate e de fazer uma forte aposta na especialização".

Questionado na passada semana pelo PÚBLICO, o ministro da Justiça, Alberto Martins, garantiu que estão a ser reforçados os meios de combate à corrupção e voltou a falar no concurso para 100 investigadores da PJ.

O deputado socialista Ricardo Rodrigues admite que a falta de meios e de especialização "é um problema", mas lembra que com os governos PS já entraram para a PJ 150 novos investigadores e acentua que foi aberto concurso para mais 100. "Esse não é o único problema para as dificuldades no combate à corrupção. Há também pessoas a enjeitar responsabilidades. É muito fácil a alguns senhores procuradores e procuradoras, que acham que são uns ases, enjeitarem responsabilidades, mas quando é para apresentarem resultados estes não se vêem", diz Ricardo Rodrigues.

O novo presidente da Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal (ASFIC) da PJ, Carlos Garcia, valoriza a entrada para breve de novos investigadores na PJ, bem como a abertura de novos concursos, mas lembra que esses agentes não vão para o departamento de perícias, que "é composto por membros da área administrativa". "Podem fazer as melhores leis, se não houver meios e formação tudo ficará mais ou menos na mesma", afirmou ao PÚBLICO.

Egídio Cardoso, director da Unidade de Perícia Financeira e Contabilística da PJ, ouvido no parlamento, admitiu que neste momento há um problema com a falta de peritos no Porto, mas garantiu que Lisboa está a "dar resposta". "Mas a minha experiência de muitos anos diz-me que esta situação pode ser só momentânea", afirmou. E explicou porquê: "A ideia é que o escolho é o magistrado, o inspector que tem algo que deveria remeter para uma perícia, para uma intervenção de natureza técnica, ou não. E ele pode pensar: "Não posso remeter isto lá para cima, porque leva x meses e eu preciso disto já." E, portanto, arranja uma forma de resolver a questão. Ora, com esta atitude, o número de pedidos vai reduzindo e, com a redução do número de pedidos, a nossa capacidade melhora e nós passamos a dar mais resposta. Mas, à medida que conseguimos dar resposta, a situação inverte-se: "Eles agora já respondem!" E, de repente, começa a aumentar o número de pedidos de perícias."

António Filipe (PCP), Filipe Lobo D"Ávila (CDS) e Luís Fazenda (BE) reconhecem igualmente que a falta de meios humanos para o combate à corrupção, com destaque para os peritos da área financeira, é um problema grave, mas salientam que, além de pressionarem o Governo, nada podem fazer. O socialista Vera Jardim, presidente da comissão parlamentar, também o reconhece, embora diga que "às vezes se empola um pouco".


Por Luciano Alvarez, in PUBLICO.PT

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