sexta-feira, maio 29, 2009

Crianças desprotegidas

Por Prof. Dr. Paulo Pinto de Albuquerque
"A protecção e guarda das crianças desprotegidas é uma tarefa fundamental do Estado e da sociedade civil. Quando a criança é vítima de maus tratos ou negligência, é um dever cívico de cada cidadão denunciar a situação às autoridades públicas, como é também um dever do Estado intervir e assegurar as condições necessárias para o bem-estar da criança. Mesmo que essa intervenção se faça contra a vontade dos pais da criança maltratada. Se os pais são cidadãos estrangeiros que querem regressar ao seu país de origem, o Estado só deve entregar a criança aos pais se existirem garantias seguras das autoridades do país de destino da criança de acompanhamento da criança.

É certo que num Estado de Direito deve valer o princípio da subsidiariedade, isto é, a família tem o lugar primordial na educação e nos cuidados a prestar à criança. A intervenção do Estado só deve ter lugar quando os pais não querem ou não podem assegurar o bem-estar da criança. Contudo, em Portugal verifica-se que uma excessiva valorização deste princípio pelas autoridades públicas, com manifesto prejuízo do interesse da criança.

O exemplo mais flagrante dessa valorização excessiva é o que se passa com as comissões de protecção de crianças e jovens em perigo. Elas só podem actuar com consentimento dos pais, mesmo que sejam eles os responsáveis pelos maus tratos ou negligência. Muitas vezes os pais são contactados por via escrita e só comparecem ao fim de três e quatro convocatórias, quando se recorre a notificação pela polícia

A situação é ainda agravada pelo modo como estas comissões estão organizadas. A fraca articulação entre as comissões e as entidades locais atrasa a comunicação dos casos de maus tratos e negligência e promove o desconhecimento pelas comissões das situações de risco. Por outro lado, nas comissões há poucos membros a tempo inteiro e são insuficientes os membros a meio tempo. Muitas vezes, as entidades locais representadas nas comissões não valorizam o trabalho dos seus representantes nas comissões, afectando-os com pouco tempo. Pior ainda é o caso daquelas comissões em que a nomeação dos membros é partidarizada, em prejuízo da designação de técnicos com maior competência e apetência pelos assuntos dos menores. Enfim, é sabido que a maior parte das comissões alargadas não funciona ou funciona debilmente. O resultado prático destas insuficiências é o de que os membros das comissões concentram o seu esforço na obtenção do acordo dos pais para a intervenção, relegando para segundo plano o acompanhamento da execução do acordo. O verdadeiro trabalho de reabilitação da relação parental fica por fazer."

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