sexta-feira, julho 23, 2010

A (in)utilidade da PJ

Por Paulo Pereira de Almeida
"Estamos num momento de viragem, e torna-se urgente que se pense de forma séria - e sem reserva mental - a questão da investigação criminal em Portugal. Pensar esta questão sem reserva mental implica, em meu entender, que se preste uma atenção particular a dois problemas. São - é necessário dizê-lo de forma clara - dois problemas complexos e para os quais ainda é difícil encontrar uma resposta conclusiva.

O primeiro destes problemas é o da partilha da informação na investigação criminal. Na verdade, é hoje em dia voz corrente entre os profissionais das forças e serviços de segurança (FSS) que muita da informação partilhada tem de ser negociada. Ou seja: um processo que deveria, creio eu, ser natural e fluido é, muitas vezes, objecto de uma (às vezes difícil) negociação entre profissionais que - à partida - devem estar a trabalhar para um mesmo objectivo. Ora esta pode ser uma questão que assume proporções algo gravosas se considerarmos que as duas grandes polícias (PSP e GNR) se encontram na tutela do Ministério da Administração Interna (MAI) e que a polícia de investigação criminal (PJ) se encontra na tutela de um ministério diferente, o Ministério da Justiça (MJ). O segundo problema é o da partilha de meios na investigação criminal. Na realidade, é também voz corrente entre os profissionais das FSS que existe uma contradição operacional entre a distribuição de efectivos no terreno e os meios de investigação a que cada um tem acesso. Ou seja: se a PJ tem vindo a especializar-se progressivamente numa criminalidade que já não está muito "na rua", a verdade é que continua a ser a PJ que detém os meios essenciais a muita dessa investigação que, recorde-se, é muitas vezes iniciada pelos profissionais da PSP e da GNR. Esta também é uma questão importante uma vez que os profissionais da PSP e da GNR são, regra geral, os primeiros a chegar aos locais de ocorrência. O que se percebe: são eles quem está "na rua". Por fim, um terceiro problema - e que ainda está seguramente na memória recente de muitos - é o da relação com o Ministério Público (MP). Também aqui se percebe bem o problema dos nossos magistrados: perante milhares de processos que podem ter em mãos, olhando depois para o número de profissionais da PJ e percebendo que estes - por mais boa vontade que demonstrem - não possuem humanamente capacidade para dar resposta a todas as suas solicitações, o que fazer então? A resposta tem sido óbvia: começar a recorrer aos profissionais da PSP e da GNR que - com o passar do tempo - também têm vindo a ganhar experiência na investigação criminal.

Por tudo isto, creio que seria de grande interesse para todos que se pensasse - de forma séria e sem reservas, repito - como reorganizar o papel da PJ num futuro modelo de Sistema de Segurança Interna. Deixo - a título de exemplo - duas pistas para discussão: Não seria porventura mais útil ter uma agência altamente qualificada funcionalmente independente no quadro do MAI? E não seria porventura mais interessante que o modelo de colaboração entre essa agência e o MP assentasse numa clara definição de prioridades. À semelhança do que se faz - e em meu entender bem - na Inglaterra com a SOCA (Serious Organised Crime Agency)? Fica, pois, o repto."

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