domingo, dezembro 16, 2007

Agentes da PJ abrem guerra contra Pinto Monteiro

A actuação do procurador-geral da República no combate à violência na noite do Porto está a provocar fortes reacções de repúdio na Polícia Judiciária (PJ). Primeiro foi o director nacional da Judiciária a emitir um despacho interno em que mostra fortes discordâncias com Pinto Monteiro, agora são os agentes que se viram contra ele e de forma muito agressiva.

A Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal (ASFIC) da PJ, que representa cerca de 90 por cento dos funcionários desta área da Judiciária, emitiu um comunicado interno intitulado Basta! - que nada tem a ver com o despacho do director nacional e que está a ser divulgado este fim-de-semana entre os agentes -, que não poupa críticas ao procurador-geral, especialmente por este ter criado uma equipa especial de investigação chefiada por uma procuradora de Lisboa para o combate aos crimes na noite do Porto.

No documento, a que o PÚBLICO teve acesso, é afirmado: "No momento actual, e fruto dos recentes acontecimentos na "noite do Porto", novas medidas foram tomadas, as quais, veiculadas através dos órgãos de comunicação social, transportam uma nuvem de descrédito na PJ. Por tal motivo, julgamos ter chegado o momento de dizer basta! Basta de cinismo, basta de remédios milagrosos que apenas servem para sacudir a água do capote."

Horas extraordinárias

"Vive-se uma época em que para cada problema da área criminal que causa alguma preocupação, o sr. procurador-geral da República cria uma equipa especial de investigação. A partir desse momento, a sensação que resulta é a de que o problema desapareceu. Tudo milagrosamente fica resolvido, porque os especiais entraram no jogo. E todos adormecemos sob o "canto de mecenas". Governo satisfeito, porque não resolveu os problemas de fundo no seio das instituições que combatem a criminalidade há décadas, contribuindo para que Portugal seja considerado um dos países mais seguros da Europa", lê-se ainda no comunicado.

A questão do não-pagamento das horas extraordinárias aos agentes da PJ, que há vários anos divide a polícia de investigação e o Governo, também é levantada no comunicado. Lembra a ASFIC que não há "sequer verbas para pagar o trabalho que os seus funcionários fazem fora das horas normais de serviço, seguramente os principais períodos de tempo para uma eficaz prevenção e combate à criminalidade mais violenta". "Na PJ, os problemas laborais deixaram de ser preocupação da Direcção e do Ministério da Justiça, para passarem a ser, imagine-se, um acto dependente do voluntarismo de cada um dos seus funcionários."

A questão das horas extraordinárias não entra no comunicado por acaso. A violência no Porto está a obrigar várias dezenas de agentes a trabalho extraordinário não-renumerado, o que está, mais uma vez, a causar forte polémica na PJ. Daí que a ASFIC refira que o Estado deixa ao "livre arbítrio de cada um [dos agentes]" a responsabilidade do combate ao crime mais violento, "transferindo o ónus para o dever e a dedicação à causa pública e ao combate ao crime, numa questão residual da mera consciência dos investigadores criminais".

Lisboa-Porto

A ASFIC volta, a seguir, ao procurador-geral, às suas equipas especiais e às discordâncias entre Pinto Monteiro e o procurador distrital do Porto. Para a associação, o procurador-geral dá-se por "satisfeito porque tomou medidas que demonstram a sua eficácia" e "afasta o espectro de ineficiência em resolver um problema de fundo que respeita à aparente impossibilidade de interagir com o procurador distrital do Porto, nem tão-pouco parece preocupar-se com a imagem de ineficiência que transporta para os procuradores do Porto". "Os de Lisboa é que são competentes para resolver crises, o que, visto por outro prisma, que afinal é o mesmo, traduz-se em não haver no Porto procuradores à altura de resolver situações prementes, Nem sequer um...", acrescentam.

A palavra "basta" volta em força ao texto. "Basta! Não queiram destruir uma instituição de referência, na qual trabalham funcionários que dedicam a vida em prol da sociedade que servem com toda a dedicação." "Basta!", repetem mais uma vez, acentuando que não querem "correr o erro de, um dia destes", se verem obrigados "a sugerir a criação de uma equipa especial que tome as rédeas da situação e resolva de uma vez por todas a necessidade cada vez mais premente de dotar a PJ de uma lei orgânica à altura da instituição".

Uma equipa especial que, acrescenta o comunicado, resolva a falta "de meios"; que crie legislação "que permita actuar com eficácia"; que "pugne para que cada um cumpra com rigor as suas funções específicas; "que deixe de entregar ao sector privado competências do Estado"; que "resolva definitivamente o problema que a sua compartimentação actual traduz" e que "aconselhe o procurador-geral a inteirar-se dos pontos de situação em que se encontra cada crise, evitando assim a proliferação de equipas especiais que só servem para espartilhar a PJ e, pelos vistos, de igual modo, a "casa" que dirige".

in
PUBLICO.PT

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