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Maria José Morgado quer mais rigor técnico nas acusações deduzidas pelos magistrados do Ministério Público do Departamento de Investigação Acção Penal (DIAP) de Lisboa, de que é directora.
"Tem-se detectado uma manifesta deficiência nas acusações proferidas pelo DIAP em matéria de crime de roubo, burla e falsificação" , lê-se na acta de uma reunião realizada a 3 de Março que visava aperfeiçoar os métodos de articulação entre os tribunais de julgamento, o DIAP e o DCIAP (Departamento Central de Investigação e Acção Penal). Considerando-se pouco fundamentadas as acusações deduzidas, sublinha-se naquele documento a que o DN teve acesso: "Efectivamente, ou não são descritos todos os factos efectivamente cometidos ou estão descritos os factos e não estão qualificados."
Em seguida, versando sobre uma vertente mais técnica, acrescenta-se: "Assim, impõe-se um maior rigor na descrição dos factos, não esquecendo a qualificação jurídica dos mesmos." E adverte-se: "Na verdade, há que ter em conta que nos termos do artigo 359.º n.2 do Código de Processo Penal (CPP), não sendo os factos autonomizáveis, não é possível ao MP proceder criminalmente pelos mesmos."
As mesmas advertências se fazem relativamente aos factos provados constantes nas acusações. Lê-se naquele documento: "Continua a detectar-se uma deficiente indicação da prova. Umas vezes por simplesmente não ser indicada, outras por sê-lo de forma incorrecta e/ou deficiente."
Naquela reunião esteve Maria José Morgado, pelo DIAP, Maria Antonieta Borges, pelo DCIAP, José Góis, em representação do MP do Tribunal da Boa-Hora, Eliete Fidalgo Dias, pelo MP dos Juízos Criminais de Lisboa, Josefina Fernandes, pelo Tribunal de Instrução Criminal (TIC) de Lisboa, e João Guerra, em representação da 4.ª secção do DIAP.
A qualidade técnica das acusações tem sido criticada, desde há muito tempo, sobretudo entre os juízes, que são os que têm de as julgar. Mas, desde que tomou posse à frente do DIAP, em Abril de 2007, que Maria José Morgado tem encetado esforços para elevar a qualidade dos trabalhos dos magistrados. Começou por fazer uma espécie de ranking, divulgando internamente o volume de trabalho que cada um realiza. Carlos Figueiredo é o procurador que mais acusações deduz, apurou o DN. Por outro lado, tem tentado uniformizar critérios na dedução das acusações, impondo um maior rigor técnico. Porém, esta intervenção tem causado algum mal-estar entre os magistrados do MP.
Mas este é um problema real, ainda que, segundo algumas fontes avançaram ao DN, aquela acta esteja datada de Março, sendo que , desde então, já muita coisa tenha sido alterada no DIAP em termos de qualidade de trabalho final.
O próprio Sindicato dos Magistrados do Ministério Público foi sondado para promover um reflexão sobre as melhores práticas a seguir de forma a se obter os melhores resultados em julgamento, confirmou ao DN o presidente António Cluny.
Este é um assunto também muito falado entre juízes. Para Manuel Soares, secretário da Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP), trata-se de uma questão de formação e de coordenação. "O MP deveria uniformizar os métodos de investigação e de acusação", defendeu. Em seu entender, "compreende-se mal que numa magistratura hierarquizada existam no mesmo tribunal, por vezes, diferenças de procedimentos por parte dos procuradores".
De todos os modos, no Tribunal da Boa-Hora (Varas Criminais), onde a questão das más acusações foi mais levantada, regista-se que 90% dos julgamentos terminam em condenação. Por exemplo, em 2007, e até Março de 2008, registaram-se 1397 condenações e apenas 259 absolvições. Ou seja, o resultado final é notoriamente positivo.
Contactada pelo DN, Maria José Morgado fez saber que a acta em questão alude a um debate interno entre magistrados, de teor muito técnico, considerando abusiva qualquer notícia sobre o teor da mesma. Neste sentido, a directora do DIAP de Lisboa quis que ficasse esclarecido que não autorizou qualquer referência pública sobre aquele documento interno.
in DN Online.
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