Entrevista. António Cluny, presidente do sindicato do MP
Congresso extraordinário. Justifica-se este toque a reunir?
O congresso realiza-se em função apenas do cumprimento de uma determinação da assembleia geral do SMMP, que foi capaz de prever que este seria o momento exacto para o debate sobre o novo Estatuto do MP.
O que é que o novo Estatuto do MP tem que cause tanta preocupação?
O Estatuto pode ter repercussões importantes na qualidade da justiça, objectivo para o qual o MP está encarregado de contribuir. Houve alterações que criaram, no mínimo, cláusulas abertas que têm de ser preenchidas de forma a que não restem dúvidas de que o MP continua a ser uma magistratura que se rege por garantias constitucionais. Há o problema de as comarcas actuais não serem, como antigamente, uni-concelhias. Com o novo mapa judiciário, há comarcas que distam 200 km. Se se der o poder à hierarquia de movimentar magistrados nesse amplo espaço, isso coloca em causa o princípio da estabilidade. Que não visa a defesa da vida pessoal do magistrado, mas pretende dar garantia de que a sua carreira não é afectada devido às posições que toma nos processos.
Acredita que se um magistrado tiver muitos processos para despachar, a hierarquia o transfira, correndo o risco de atrasar ainda mais o desenrolar dos mesmos?
O perigo é que possam ser substituídos por outros que tenham uma orientação diferente para os processos em concreto. As actuais garantias existem para evitar a escolha de determinados procuradores para certos processos em função de determinados interesses.
Uma das propostas do SMMP é que o acesso ao DCIAP seja por concurso. Não acha normal que quem esteja à frente daquele departamento tenha a faculdade de escolher directamente uma equipa?
O MP não é uma empresa. É uma estrutura que dirige processos que contendem com direitos, liberdades e garantias. O concurso significa que, pelo menos do ponto de vista curricular, se coloca o lugar a concurso e o Conselho Superior escolherá as pessoas mais adequadas. Se não for assim, no fundo, acabam sempre por ser escolhidas as pessoas que trabalham nos grandes centros, as que estão mais próximas dos poderes. Fora, também há excelentes magistrados. O que não podemos admitir é que alguém esteja num departamento deste tipo por confiança, não se sabe bem de quem ou de quê. Não podemos permitir este tipo de colocações que sempre levantam suspeições.
"A capacidade que o MP tiver de, com objectividade, eficácia e também total transparência, levar a cabo essas investigações ditarão, por certo, o destino da actual organização e o papel que nela desempenha ou há-de vir a desempenhar esta magistratura". Isto está num editorial do Sindicato. O que pretende insinuar?
Não é insinuação. Estamos num momento muito crítico, com processos muito críticos, quase emblemáticos. Exige-se que não restem nenhumas dúvidas nem suspeições sobre a actividade do MP, seja do ponto de vista técnico ou do sentido da decisão final.Todos estes processos, e três ou quatro em particular, marcarão, num momento de crise social, económica e eventualmente política, - isto é uma apreciação estritamente pessoal - o futuro da democracia portuguesa.
Não está a exagerar?
Não. Há aqui questões muito complicadas, que nunca foram perceptíveis aos cidadãos. A sociedade portuguesa é confrontada com certo tipo de questões que têm a ver com a transparência do sistema e antes não o era. E estas situações, para o bem e para o mal, passam pelo MP. A capacidade que o MP tiver para apresentar resultados marcará o regime no seu todo e a parte que diz respeito à capacidade do sistema judicial em intervir neste tipo de situações.
O que é que leva o sindicato a profetizar, numa das teses ao congresso, o "fim" do MP?
Não é preciso profetizar muito. A Lei de Política Criminal, se não é, raia a inconstitucionalidade, limita já o MP. Com um Estatuto que meta entre parêntesis as garantias previstas na Constituição, pouco resta para que o MP possa ser considerado uma magistratura.
A carreira de procurador é aliciante?
Não é. Houve uma proposta acordada com o Governo e o PS que premiava o mérito de quem trabalhava mais e melhor e distinguia ainda a formação dos magistrados.
O sindicato também não tem relações institucionais com a Ordem dos Advogados. É por causa do bastonário, Marinho Pinto?
Temos relações institucionais com o Conselho Superior, com os conselhos distritais, etc. Quem não tem boas relações connosco é o bastonário. Como ele acha que o SMMP não representa ninguém, não queremos criar-lhe nenhum embaraço, convidando-o para o congresso.
Por Carlos Rodrigues Lima, in DN Online.
Congresso extraordinário. Justifica-se este toque a reunir?
O congresso realiza-se em função apenas do cumprimento de uma determinação da assembleia geral do SMMP, que foi capaz de prever que este seria o momento exacto para o debate sobre o novo Estatuto do MP.
O que é que o novo Estatuto do MP tem que cause tanta preocupação?
O Estatuto pode ter repercussões importantes na qualidade da justiça, objectivo para o qual o MP está encarregado de contribuir. Houve alterações que criaram, no mínimo, cláusulas abertas que têm de ser preenchidas de forma a que não restem dúvidas de que o MP continua a ser uma magistratura que se rege por garantias constitucionais. Há o problema de as comarcas actuais não serem, como antigamente, uni-concelhias. Com o novo mapa judiciário, há comarcas que distam 200 km. Se se der o poder à hierarquia de movimentar magistrados nesse amplo espaço, isso coloca em causa o princípio da estabilidade. Que não visa a defesa da vida pessoal do magistrado, mas pretende dar garantia de que a sua carreira não é afectada devido às posições que toma nos processos.
Acredita que se um magistrado tiver muitos processos para despachar, a hierarquia o transfira, correndo o risco de atrasar ainda mais o desenrolar dos mesmos?
O perigo é que possam ser substituídos por outros que tenham uma orientação diferente para os processos em concreto. As actuais garantias existem para evitar a escolha de determinados procuradores para certos processos em função de determinados interesses.
Uma das propostas do SMMP é que o acesso ao DCIAP seja por concurso. Não acha normal que quem esteja à frente daquele departamento tenha a faculdade de escolher directamente uma equipa?
O MP não é uma empresa. É uma estrutura que dirige processos que contendem com direitos, liberdades e garantias. O concurso significa que, pelo menos do ponto de vista curricular, se coloca o lugar a concurso e o Conselho Superior escolherá as pessoas mais adequadas. Se não for assim, no fundo, acabam sempre por ser escolhidas as pessoas que trabalham nos grandes centros, as que estão mais próximas dos poderes. Fora, também há excelentes magistrados. O que não podemos admitir é que alguém esteja num departamento deste tipo por confiança, não se sabe bem de quem ou de quê. Não podemos permitir este tipo de colocações que sempre levantam suspeições.
"A capacidade que o MP tiver de, com objectividade, eficácia e também total transparência, levar a cabo essas investigações ditarão, por certo, o destino da actual organização e o papel que nela desempenha ou há-de vir a desempenhar esta magistratura". Isto está num editorial do Sindicato. O que pretende insinuar?
Não é insinuação. Estamos num momento muito crítico, com processos muito críticos, quase emblemáticos. Exige-se que não restem nenhumas dúvidas nem suspeições sobre a actividade do MP, seja do ponto de vista técnico ou do sentido da decisão final.Todos estes processos, e três ou quatro em particular, marcarão, num momento de crise social, económica e eventualmente política, - isto é uma apreciação estritamente pessoal - o futuro da democracia portuguesa.
Não está a exagerar?
Não. Há aqui questões muito complicadas, que nunca foram perceptíveis aos cidadãos. A sociedade portuguesa é confrontada com certo tipo de questões que têm a ver com a transparência do sistema e antes não o era. E estas situações, para o bem e para o mal, passam pelo MP. A capacidade que o MP tiver para apresentar resultados marcará o regime no seu todo e a parte que diz respeito à capacidade do sistema judicial em intervir neste tipo de situações.
O que é que leva o sindicato a profetizar, numa das teses ao congresso, o "fim" do MP?
Não é preciso profetizar muito. A Lei de Política Criminal, se não é, raia a inconstitucionalidade, limita já o MP. Com um Estatuto que meta entre parêntesis as garantias previstas na Constituição, pouco resta para que o MP possa ser considerado uma magistratura.
A carreira de procurador é aliciante?
Não é. Houve uma proposta acordada com o Governo e o PS que premiava o mérito de quem trabalhava mais e melhor e distinguia ainda a formação dos magistrados.
O sindicato também não tem relações institucionais com a Ordem dos Advogados. É por causa do bastonário, Marinho Pinto?
Temos relações institucionais com o Conselho Superior, com os conselhos distritais, etc. Quem não tem boas relações connosco é o bastonário. Como ele acha que o SMMP não representa ninguém, não queremos criar-lhe nenhum embaraço, convidando-o para o congresso.
Por Carlos Rodrigues Lima, in DN Online.
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