Por Daniel Deusdado, Jornalista
in Diário Económico
"Sempre que vejo a pompa do “Arranque do Ano Judicial”, inevitavelmente acompanhado pelo discurso dos Presidentes da República, chefes de juízes, advogados, procuradores, etc... desligo. É insuportável. É inútil.
Fiz Direito e sei que os princípios estão todos certos. Mas os portugueses sabem que não podem confiar nos tribunais. Não apenas por causa dos juízes, funcionários, advogados ou má concepção das leis mas também por causa deles próprios - meio mundo anda a tramar a outra metade. Impunemente. E sem fim à vista.
Soluções? Todos querem aquilo a que se chama de "mais meios". Em regra isto quer dizer mais dinheiro para mais funcionários, mais edifícios, mais informática, mais, mais, mais... Todos os anos.
Entretanto, os processos crescem, crescem... A manchete desta segunda-feira do Económico - 730 milhões perdidos pelo Estado em IVA -, é apenas mais um episódio do estímulo social chamado "manda para tribunal"... Outros seguir-se-ão.
Meus amigos, esqueçam. Não é com mais edifícios, mais ou melhores juízes e funcionários, advogados mais escrupulosos ou uma utopia de regresso aos "cidadãos respeitadores da lei" que vamos lá. É com uma mudança radical. Qual?
Avanço com dois pontos:
1) Semi-privatização da Justiça que envolva dívidas ou bens patrimoniais. Os juízes continuariam a pertencer ao Estado (ou não) e o resto estaria assente numa organização empresarial capaz de se tornar eficiente à custa do seu próprio trabalho. Neste momento a "soberana função judicial" está tão protegida que ninguém responde pelo "dano social" da sua confrangedora lentidão. O caso da privatização dos notários é um bom exemplo de como a esfera privada funciona melhor.
2) Corte radical com o sistema jurídico actual, evoluindo-se para uma fase processual e de julgamento com base na matriz anglo-saxónica da ‘commom law'. O "caso análogo", assente em decisões de juízes/júris anteriores, permite, aliás, a actualização da Justiça à dinâmica social, coisa que o actual sistema de leis não permite - daí tantas vezes vermos gente a sair do tribunal com sorriso só porque praticou coisas que não foram consideradas ilegais, mas são profundamente imorais (e portanto, puníveis se a lei fosse "viva"). A matriz do "caso análogo" é possível no mundo anglo-saxónico, frise-se, sem qualquer desrespeito pelos princípios constitucionais nem fomento do justicialismo de circunstância.
Ok, e agora discordem, achem absurdo, impossível, blá-blá-blá... Mas, das duas uma: ou as corporações da Justiça se entendem e põem a coisa a funcionar de uma vez por todas, ou Portugal não funciona mesmo. Não se pode continuar com esta degradação económica e social. Este pântano é inconstitucional."
"Sempre que vejo a pompa do “Arranque do Ano Judicial”, inevitavelmente acompanhado pelo discurso dos Presidentes da República, chefes de juízes, advogados, procuradores, etc... desligo. É insuportável. É inútil.
Fiz Direito e sei que os princípios estão todos certos. Mas os portugueses sabem que não podem confiar nos tribunais. Não apenas por causa dos juízes, funcionários, advogados ou má concepção das leis mas também por causa deles próprios - meio mundo anda a tramar a outra metade. Impunemente. E sem fim à vista.
Soluções? Todos querem aquilo a que se chama de "mais meios". Em regra isto quer dizer mais dinheiro para mais funcionários, mais edifícios, mais informática, mais, mais, mais... Todos os anos.
Entretanto, os processos crescem, crescem... A manchete desta segunda-feira do Económico - 730 milhões perdidos pelo Estado em IVA -, é apenas mais um episódio do estímulo social chamado "manda para tribunal"... Outros seguir-se-ão.
Meus amigos, esqueçam. Não é com mais edifícios, mais ou melhores juízes e funcionários, advogados mais escrupulosos ou uma utopia de regresso aos "cidadãos respeitadores da lei" que vamos lá. É com uma mudança radical. Qual?
Avanço com dois pontos:
1) Semi-privatização da Justiça que envolva dívidas ou bens patrimoniais. Os juízes continuariam a pertencer ao Estado (ou não) e o resto estaria assente numa organização empresarial capaz de se tornar eficiente à custa do seu próprio trabalho. Neste momento a "soberana função judicial" está tão protegida que ninguém responde pelo "dano social" da sua confrangedora lentidão. O caso da privatização dos notários é um bom exemplo de como a esfera privada funciona melhor.
2) Corte radical com o sistema jurídico actual, evoluindo-se para uma fase processual e de julgamento com base na matriz anglo-saxónica da ‘commom law'. O "caso análogo", assente em decisões de juízes/júris anteriores, permite, aliás, a actualização da Justiça à dinâmica social, coisa que o actual sistema de leis não permite - daí tantas vezes vermos gente a sair do tribunal com sorriso só porque praticou coisas que não foram consideradas ilegais, mas são profundamente imorais (e portanto, puníveis se a lei fosse "viva"). A matriz do "caso análogo" é possível no mundo anglo-saxónico, frise-se, sem qualquer desrespeito pelos princípios constitucionais nem fomento do justicialismo de circunstância.
Ok, e agora discordem, achem absurdo, impossível, blá-blá-blá... Mas, das duas uma: ou as corporações da Justiça se entendem e põem a coisa a funcionar de uma vez por todas, ou Portugal não funciona mesmo. Não se pode continuar com esta degradação económica e social. Este pântano é inconstitucional."
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