Por Prof. Dr. Paulo Pinto de Albuquerque
"A escuta de conversas em que intervenha o primeiro-ministro obedece a um novo regime desde a revisão do Código de Processo Penal de 2007. O novo regime coloca, entre outros, três problemas: o da autorização, o da publicidade e o da destruição destas escutas.
O Código de 2007 previu uma nova competência do presidente do STJ para autorizar e fiscalizar a intercepção de conversas do Presidente da República, do presidente da Assembleia da República e do primeiro-ministro. Esta competência só tem lugar quando se indicie a prática de crimes cometidos fora do exercício das funções daqueles titulares de cargos políticos, cujo julgamento compete ao tribunal de primeira instância. Tratando-se de um crime cometido no exercício das funções, cujo julgamento compete ao STJ, o controlo das escutas já pertencia antes de 2007, e continua a pertencer depois de 2007, ao juiz da secção criminal do STJ que deva praticar actos jurisdicionais no inquérito, nos termos do artigo 11.º, n.º 7, do Código de Processo Penal.
A competência do STJ não cobre, nem tinha de cobrir, os casos em que o primeiro-ministro não é suspeito da prática de qualquer crime e mantém conversas telefónicas com um suspeito. Por uma razão simples e óbvia. É que o primeiro-ministro não é então o visado pela escuta, ele não é o suspeito, nem intermediário, do suspeito. A exigência de uma autorização prévia do STJ de uma escuta tida por um suspeito com o primeiro-ministro que é um mero interlocutor obrigaria o juiz de primeira instância a fazer de adivinho. O juiz teria de adivinhar quem são os interlocutores com quem o suspeito iria falar antes de se iniciar a escuta e, caso adivinhasse que o suspeito iria falar com o primeiro-ministro, teria então a escuta de ser autorizada pelo STJ. A inexequibilidade desta exigência mostra à evidência a sua falta de fundamento. Acresce que esta exigência constituiria um inadmissível regime de privilégio para as pessoas das relações pessoais do primeiro-ministro, mesmo que estas pessoas fossem suspeitas da prática de crimes. Um tal regime de conversas privilegiadas violaria o princípio da igualdade.
Portanto, a relevância jurídico-criminal das conversas telefónicas tidas por um suspeito com um primeiro-ministro, que não é ele próprio suspeito da prática de um crime, nem intermediário do suspeito, é fiscalizada pelo juiz de primeira instância que determinou a escuta.
O incidente de autorização das escutas é matéria sujeita ao mais estrito e rigoroso segredo de justiça, não podendo ser reveladas na praça pública factos atinentes ao processamento deste incidente. Seja quem for o suspeito. Sejam quem forem os parceiros que mantiveram conversas com o suspeito.
A destruição das escutas irrelevantes só pode ter lugar no final da investigação criminal, de modo a que a defesa tenha a oportunidade de conhecer todo o material das escutas e possa opor-se à destruição. Viola de forma crassa o direito de defesa a destruição de escutas ordenada pelo juiz nas costas do arguido, sem que ele saiba quais foram as conversas escutadas. Como decidiu o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no segundo caso Dumitru Popescu."
O Código de 2007 previu uma nova competência do presidente do STJ para autorizar e fiscalizar a intercepção de conversas do Presidente da República, do presidente da Assembleia da República e do primeiro-ministro. Esta competência só tem lugar quando se indicie a prática de crimes cometidos fora do exercício das funções daqueles titulares de cargos políticos, cujo julgamento compete ao tribunal de primeira instância. Tratando-se de um crime cometido no exercício das funções, cujo julgamento compete ao STJ, o controlo das escutas já pertencia antes de 2007, e continua a pertencer depois de 2007, ao juiz da secção criminal do STJ que deva praticar actos jurisdicionais no inquérito, nos termos do artigo 11.º, n.º 7, do Código de Processo Penal.
A competência do STJ não cobre, nem tinha de cobrir, os casos em que o primeiro-ministro não é suspeito da prática de qualquer crime e mantém conversas telefónicas com um suspeito. Por uma razão simples e óbvia. É que o primeiro-ministro não é então o visado pela escuta, ele não é o suspeito, nem intermediário, do suspeito. A exigência de uma autorização prévia do STJ de uma escuta tida por um suspeito com o primeiro-ministro que é um mero interlocutor obrigaria o juiz de primeira instância a fazer de adivinho. O juiz teria de adivinhar quem são os interlocutores com quem o suspeito iria falar antes de se iniciar a escuta e, caso adivinhasse que o suspeito iria falar com o primeiro-ministro, teria então a escuta de ser autorizada pelo STJ. A inexequibilidade desta exigência mostra à evidência a sua falta de fundamento. Acresce que esta exigência constituiria um inadmissível regime de privilégio para as pessoas das relações pessoais do primeiro-ministro, mesmo que estas pessoas fossem suspeitas da prática de crimes. Um tal regime de conversas privilegiadas violaria o princípio da igualdade.
Portanto, a relevância jurídico-criminal das conversas telefónicas tidas por um suspeito com um primeiro-ministro, que não é ele próprio suspeito da prática de um crime, nem intermediário do suspeito, é fiscalizada pelo juiz de primeira instância que determinou a escuta.
O incidente de autorização das escutas é matéria sujeita ao mais estrito e rigoroso segredo de justiça, não podendo ser reveladas na praça pública factos atinentes ao processamento deste incidente. Seja quem for o suspeito. Sejam quem forem os parceiros que mantiveram conversas com o suspeito.
A destruição das escutas irrelevantes só pode ter lugar no final da investigação criminal, de modo a que a defesa tenha a oportunidade de conhecer todo o material das escutas e possa opor-se à destruição. Viola de forma crassa o direito de defesa a destruição de escutas ordenada pelo juiz nas costas do arguido, sem que ele saiba quais foram as conversas escutadas. Como decidiu o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem no segundo caso Dumitru Popescu."
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