Por Prof. Dra. Fernanda Palma
Professora catedrática de Direito Penal
“O problema de segurança, que está a ser objecto de uma actuação policial eficaz, só tem a resposta decisiva com uma política mais veemente de reinserção social”.
"Convido os leitores a consultarem, no site do Ministério da Justiça, o documento de monitorização da reforma penal, apresentado por uma equipa de investigadores. Há nele registos de depoimentos que revelam como alguns magistrados (espero que uma ínfima minoria) tiveram comportamentos que, a confirmarem-se, causam perplexidade.
Num caso, um polícia diz: "Tive um interrogatório numa data em que o tribunal estava de turno e tivemos de estar à espera que chegasse o juiz. Entretanto o juiz chega e começa a falar com o procurador e começo a ouvir: ‘Mas que é isto? Para que é que esperam por mim? Podem libertá-lo logo! Agora só quem mata é preso!’."
Conclui, desiludido, o polícia entrevistado: "E eu a ouvir isto com o arguido que tinha tido uma noite agitada: furtou tudo o que eram bombas de combustível e atropelou um polícia. Certamente que depois de ouvir isto, quando saiu foi fazer a mesma coisa até porque não tinha dinheiro para voltar para casa. Sabia que não ia ser preso."
Noutros depoimentos, os polícias referem que não conseguem falar, de noite, com procuradores e que têm dúvidas quanto à orientação a seguir. Segundo dizem, para um crime com gravidade suficiente para se aplicar a prisão preventiva um procurador terá transmitido pelo telefone, às duas da manhã, a seguinte mensagem: "Libertem-no."
Estes dados são públicos e resultam de uma investigação credível. Indiciam que alguns magistrados – acredito que em minoria – parecem agir preconceituosamente, porque rejeitam interpretar no seu espírito as novas leis. Ora, tais comportamentos não são próprios de titulares de órgãos de soberania ou de representantes do Estado de Direito.
Qualquer jurista, lendo o Código de Processo Penal e a Lei de Política Criminal, compreende que a prisão preventiva é aplicável a crimes violentos, como atropelamento de polícias, assalto à mão armada ou até ofensas corporais contra autoridade pública, se houver perigo de continuação da actividade criminosa. A protecção de potenciais vítimas impõe a medida, se não houver alternativas eficazes.
É essa a exigência da legalidade democrática. Não é necessário encher as cadeias de presos preventivos, com prazos dilatados, o que não constitui solução para a criminalidade. Essa foi a política criminal indiscriminada da pré-reforma, apesar da tendência positiva de muitos juízes para o uso moderado da prisão preventiva nos últimos anos.
Como é óbvio, o depoimento citado justifica, pelos seus erros e efeitos, uma séria reflexão. Mas o problema de segurança, que está a ser objecto de uma actuação policial eficaz, só tem a resposta decisiva com uma política mais veemente de reinserção social, em que Estado e comunidades terão de cooperar."
"Convido os leitores a consultarem, no site do Ministério da Justiça, o documento de monitorização da reforma penal, apresentado por uma equipa de investigadores. Há nele registos de depoimentos que revelam como alguns magistrados (espero que uma ínfima minoria) tiveram comportamentos que, a confirmarem-se, causam perplexidade.
Num caso, um polícia diz: "Tive um interrogatório numa data em que o tribunal estava de turno e tivemos de estar à espera que chegasse o juiz. Entretanto o juiz chega e começa a falar com o procurador e começo a ouvir: ‘Mas que é isto? Para que é que esperam por mim? Podem libertá-lo logo! Agora só quem mata é preso!’."
Conclui, desiludido, o polícia entrevistado: "E eu a ouvir isto com o arguido que tinha tido uma noite agitada: furtou tudo o que eram bombas de combustível e atropelou um polícia. Certamente que depois de ouvir isto, quando saiu foi fazer a mesma coisa até porque não tinha dinheiro para voltar para casa. Sabia que não ia ser preso."
Noutros depoimentos, os polícias referem que não conseguem falar, de noite, com procuradores e que têm dúvidas quanto à orientação a seguir. Segundo dizem, para um crime com gravidade suficiente para se aplicar a prisão preventiva um procurador terá transmitido pelo telefone, às duas da manhã, a seguinte mensagem: "Libertem-no."
Estes dados são públicos e resultam de uma investigação credível. Indiciam que alguns magistrados – acredito que em minoria – parecem agir preconceituosamente, porque rejeitam interpretar no seu espírito as novas leis. Ora, tais comportamentos não são próprios de titulares de órgãos de soberania ou de representantes do Estado de Direito.
Qualquer jurista, lendo o Código de Processo Penal e a Lei de Política Criminal, compreende que a prisão preventiva é aplicável a crimes violentos, como atropelamento de polícias, assalto à mão armada ou até ofensas corporais contra autoridade pública, se houver perigo de continuação da actividade criminosa. A protecção de potenciais vítimas impõe a medida, se não houver alternativas eficazes.
É essa a exigência da legalidade democrática. Não é necessário encher as cadeias de presos preventivos, com prazos dilatados, o que não constitui solução para a criminalidade. Essa foi a política criminal indiscriminada da pré-reforma, apesar da tendência positiva de muitos juízes para o uso moderado da prisão preventiva nos últimos anos.
Como é óbvio, o depoimento citado justifica, pelos seus erros e efeitos, uma séria reflexão. Mas o problema de segurança, que está a ser objecto de uma actuação policial eficaz, só tem a resposta decisiva com uma política mais veemente de reinserção social, em que Estado e comunidades terão de cooperar."
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