"A primeira semana de implementação da reforma do mapa judiciário veio confirmar os piores receios quanto à viabilidade da execução deste modelo de reorganização judiciária no prazo estabelecido na Lei que o aprovou.
A indisponibilidade da plataforma informática Citius, a incompletude da migração física dos processos, o desajustamento das instalações judiciárias, a falta de funcionários de justiça e a visibilidade judiciária, mediática e política dos tribunais, originou um enorme desgaste no sistema, passível de causar danos irreparáveis na confiança que os cidadãos deveriam ter na justiça. Tudo isto era evitável e foi objecto de sucessivos avisos por parte da ASJP, durante o processo de consolidação legislativa.
Perante uma opção que apostava num modelo de concentração da reforma, apresentámos, em devido tempo, uma proposta que pretendia minorar os efeitos imprevisíveis e preocupantes do que foi aprovado, sobretudo porque não se atendia devidamente aos problemas e às disfunções estruturais do sistema judicial, dos quais se evidencia a incapacidade organizativa instalada do sistema (incluindo tecnológica), a ausência de racionalidade empírica e de leitura de dados essenciais para a reforma, e, por último, a dinâmica estratégica dos actores envolvidos.
Uma reforma desta amplitude teria que assegurar, na sua execução, um sistema de informação suficientemente poderoso para sustentar toda a mudança, levando em conta as experiências das comarcas experimentais.
Propusemos a seu devido tempo a implementação faseada da reforma legal do mapa judiciário em três passos: no 1.º ano de execução da reforma procedia-se à implementação da lei, no 2.º ano de execução da reforma procedia-se à regulamentação da lei e no 3.º ano de execução procedia-se à instalação das comarcas.
Não foi este o caminho seguido e lamentavelmente os piores receios confirmaram-se. Porque a reforma já está em vigor impõe-se, com urgência, que sejam tomadas desde já algumas medidas que se afiguram absolutamente necessárias, para além do apuramento de responsabilidades sobre o que aconteceu.
Desde logo é urgente saber qual a data em que a plataforma Citius estará disponível para o funcionamento dos tribunais e assegurar que não se perca qualquer informação armazenada no sistema.
Em segundo lugar não devem ser evitadas soluções legislativas excepcionais, como a suspensão dos prazos processuais, a validação da prática de actos processuais em plataforma não digital, ou mesmo a dilação da vigência de alguns aspectos não essenciais desta reforma.
Em terceiro lugar impõe-se que seja efectuada uma monitorização permanente dos aspectos mais sensíveis de todo o processo de reforma em curso por quem tem responsabilidades no sistema, nomeadamente os Tribunais (através do Conselho Superior da Magistratura), o Ministério da Justiça (como impulsionador e gestor da reforma) e a Assembleia da República (legisladora da reforma e detentora última da respectiva legitimação democrática).
Nenhum destes protagonistas na implementação desta reforma se pode isentar desta tarefa e de assumir as suas responsabilidades perante o cidadão e a opinião pública. Em quarto lugar, terá que desencadear-se uma avaliação global da reforma. É urgente criar um mecanismo institucional, isento e imparcial, de acompanhamento e monitorização da reorganização do mapa judiciário. Aí deve ponderar-se a avaliação sobre (i) a nova definição territorial dos tribunais e a malha de especialização encontrada, (ii) a administração e gestão dos tribunais, (iii) a dimensão processual e a gestão dos processos, e, por último mas não menos importante (iv) a questão dos equipamentos, das instalações e das tecnologias.
A importância da justiça para o cidadão exige dos responsáveis pela gestão do sistema a responsabilidade pelo seu bom funcionamento.
Os juízes estão, desde o primeiro momento, disponíveis para responder ao que deles esperam os cidadãos.
Assim lhes sejam disponibilizadas as devidas condições estruturais e organizativas para tanto.
Lisboa 8 de Setembro de 2014"
Fonte: ASJP
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