sexta-feira, abril 02, 2010

Os números do crime

por PAULO PEREIRA DE ALMEIDA

(in DN Online)


"A divulgação das estatísticas da criminalidade reportada em Portugal em 2009, feita nas Jornadas de Segurança promovidas pelo Ministério da Administração Interna (MAI) na semana passada permitiu conhecer - em traços muito gerais - o perfil das alterações verificadas neste domínio.

Assim, e de acordo com os números do RASI (Relatório Anual de Segurança Interna), a criminalidade participada (ou seja, a que está contabilizada a partir das queixas efectivamente apresentadas pelos portugueses às forças de segurança - FS) registou um decréscimo de 1,2% em relação a 2008. Contas feitas, em 2008 tivemos 421 037 participações de crimes em Portugal, enquanto em 2009 foram 416 058. Por si só - e a meu ver - não podemos considerar que nos últimos anos haja algo de particularmente diferente neste ponto. O padrão da criminalidade em Portugal tem mantido três grandes tendências: uma tendência de territorialização (cidades mais populosas e menos seguras, diminuição das participações à GNR que opera fora das zonas urbanas); uma tendência de lateralização da criminalidade grave (intervalo de 2% para valores entre 4% e 6% do peso destes crimes na criminalidade total); e uma tendência para a persistência da criminalidade de malha fina contra o património (com valores acima de 50%).

Salvaguardada a integridade das estatísticas - dado que seria impensável e irresponsável uma pressão para a redução da criminalidade reportada (feita por este ou por qualquer outro Governo) -, a utilização de instrumentos de gestão e de planeamento operacional deve ser agora - em meu entender - a principal prioridade do sistema de segurança interna. E se um investimento no planeamento prospectivo poderá ser arriscado, ou mesmo uma pura perda de tempo (há sempre factores imponderáveis, pelo que planear a 10 ou 15 anos é algo quase impossível), a verdade é que - perante tendências estatísticas globalmente convergentes nos últimos dez anos - a criminalidade moderna exige uma acção policial unificada. As FS devem, portanto, estar dotadas de um aparelho dissuasor do crime, quantitati- va e qualitativamente adequado à sua missão, e simultaneamente pensado a partir de um organis-mo central. Ou seja: continua a ser legítimo que os cidadãos esperem uma resposta - rápida e adequa-da - do sistema de segurança interna à criminalidade que os toca mais de perto, sendo dificilmente entendível pelo cidadão comum alguma lentidão na defini-ção de um modelo de polícia.

Assim, e entre outras, a implementação operacional e no terreno do policiamento de proximidade - com efectiva visibilidade e ligação às pessoas -, a clarificação das competências daquela que poderia ser uma polícia nacional, e a sua diferenciação em relação às polícias locais - ditas municipais - são mudanças desejáveis. Que ainda tardam. Para além de discussões (quase bizantinas, diga-se) em torno de décimas nas estatísticas (muito embora cada experiência de vitimação seja sempre muito traumática e deva, naturalmente, ser tratada com todo o cuidado e respeito) a polícia do futuro deve ser única na sua acção e unívoca no planeamento. Politicamente, sei que esta é uma decisão difícil. Socialmente, estou certo da sua utilidade. Orçamentalmente, os benefícios são cada vez mais claros…"

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