sábado, abril 10, 2010

Magistrados contradizem director-geral das Prisões

Magistrados contradizem director-geral das Prisões

Rui Sá Gomes diz que os presos não são libertados pelo novo Código de Execução de Penas, mas o sindicato dos magistrados refuta, garantindo que na prática é o que vai acontecer

O director-geral dos Serviços Prisionais, Rui Sá Gomes, veio ontem garantir que o novo Código de Execução de Penas, que entra em vigor segunda-feira, "não liberta" ninguém e que "só o Código Penal" enquadra a "liberdade condicional". Referiu-se ao Código Penal quando se tratava do Código de Execução de Penas (CEP) e este desdiz, na prática, segundo os magistrados, as suas palavras (...).

Sá Gomes, na abertura do Fórum TSF sobre esta nova legislação, reagia assim ao alerta de polícias, magistrados, vítimas e do CDS-PP sobre a possibilidade, permitida pelo CEP, de um preso, seja porque crime for condenado, usufruir do chamado regime aberto, apenas tendo cumprido um quarto da pena. Este regime aberto significa que o preso passa o dia fora da prisão, sem qualquer controlo, nem electrónico nem de guardas, e volta à noite ao estabelecimento prisional.

O alarme focou-se principalmente em casos como o de Marcus Fernandes, que matou dois polícias em 2005, condenado a 25 anos de prisão, e que, de acordo com as nova lei, daqui a um ano pode pedir acesso ao regime aberto, quando apenas cumpriu seis anos e três meses da pena.

António Ventinhas, da direcção do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), que ontem também tinha manifestado a sua apreensão com as novas regras, sublinha que "tecnicamente" Sá Gomes está "correcto", mas na "prática está errado". Passa a explicar: "O criminoso está preso? Está. O Código de Execução de Penas liberta ao fim de um quarto da pena? Não. O criminoso está na rua? Está. E é isto que interessa às pessoas." Ou seja, sublinha, "na prática o detido é, de facto, libertado, na percepção do cidadão comum".

Ventinhas dá um exemplo prático. "Há uns tempos tive um caso de uma família que foi sequestrada e violentamente agredida na sua casa. Os autores foram apanhados, julgados e condenados a 20 anos de prisão. Daqui a cinco é-lhes concedido, por um simples acto administrativo, o regime aberto. A família, que estava descansada na sua casa, confiando que eles estavam presos, vê-os na rua. O que é que dizemos a esta família? Olhem, o sr. director das Prisões diz que eles estão presos."

Rui Sá Gomes veio alegar que a concessão do regime aberto depende de vários pressupostos, definidos no CEP, mas Ventinhas é da opinião que "eles oferecem uma grande margem de discricionariedade" e que nem o facto de a lei estipular que as decisões de "libertação" são comunicadas ao Ministério Público (MP) o descansa.

Não "delinquir", garantir a "protecção da vítima" ou que não se "subtraia à execução da pena", que o seu comportamento se adeque à "defesa da ordem e da paz social" são alguns dos critérios. "Como é que o MP vai poder subscrever a decisão do director-geral verificando a legalidade do cumprimento destes pressupostos? Se o director de Prisões pode assegurar que eles não vão cometer nenhum crime cá fora, que o diga", declara o magistrado.

Ontem, o CDS-PP apresentou um projecto de lei para alterar o CEP em que aumenta o cumprimento mínimo para três quartos da pena, nos crimes mais graves, acima dos cinco anos, para um preso poder requerer o regime aberto. Nas condenações inferiores a cinco anos, devem cumprir, no mínimo, dois terços. O CDS-PP defende também que a libertação seja decidida pelo juiz de execução de penas e não pelo director-geral, como está no actual CEP.

Por VALENTINA MARCELINO, in DN Online.

Sem comentários: