Fernanda Palma, Professora Catedrática de Direito Penal
O desejo, patente em certos sectores, de usar este relatório como prova de convicções nunca antes demonstradas está condenado à frustração.
É urgente substituir a política dos desejos pela análise crítica e fundamentada da realidade, informando com rigor os cidadãos e alterando, sem histerismos, o que for necessário para melhorar o sistema penal e defender os interesses da comunidade."
(in Correio da Manhã)
"Não é verdade, por mais que algum interesse político ou mediático o deseje, que o Relatório Boaventura Sousa Santos "arrase a justiça". E não é verdade porque nem os fundamentos já conhecidos nem as propostas de alteração muito cirúrgicas conduzem senão a ajustamentos pontuais, sem modificações de fundo quanto aos objectivos preventivos e humanistas da reforma.
Por exemplo, em matéria de pressupostos da prisão preventiva, o relatório não propugna o regresso à solução anterior, com a possível aplicação da medida a todos os crimes dolosos puníveis com prisão superior a três anos. Defende, apenas, a inclusão de certos crimes, como o furto qualificado, quando for punível com prisão até cinco anos, no catálogo crimes passíveis de prisão preventiva.
A proposta dá seguimento à solução da Lei das Armas e da própria reforma, que prevê a aplicação da prisão preventiva a crimes violentos e organizados puníveis com pena de prisão inferior a cinco anos. Mas o relatório propõe que a medida só se aplique a casos de prática reiterada e para evitar que a reincidência conduza a penas de prisão elevadas, contrariando até as lógicas retributivas de alguns críticos.
No que se refere ao novo regime da liberdade condicional, tão criticado na discussão partidária pré-eleitoral, a "verdade estatística" também faz cair por terra qualquer tese que associe a reforma ao aumento da criminalidade. Com efeito, depois da reforma, aumentou a taxa de libertação com metade da pena, mas diminuiu muito a taxa de libertação após o cumprimento de dois terços da pena.
Todavia, os requisitos para a libertação com metade da pena são extremamente exigentes, compreendendo a não afectação da ordem e da paz social. Assim se explica que o número de libertados condicionalmente tenha diminuído na globalidade. Por isso, não há evidência estatística de qualquer relação causal entre o regime da reforma e o aumento de criminalidade relativamente a certos crimes.
Além disso, não consta do relatório cruzamentos estatísticos que revelem se o aumento de alguns crimes violentos verificado em 2008 dependeu dos novos regimes da prisão preventiva ou da liberdade condicional. E também não consta indicações sobre se o aumento dos crimes se deveu a reincidentes, o que
permitiria apurar se as causas são geradas pelo sistema penal ou têm origem mais profunda.Por exemplo, em matéria de pressupostos da prisão preventiva, o relatório não propugna o regresso à solução anterior, com a possível aplicação da medida a todos os crimes dolosos puníveis com prisão superior a três anos. Defende, apenas, a inclusão de certos crimes, como o furto qualificado, quando for punível com prisão até cinco anos, no catálogo crimes passíveis de prisão preventiva.
A proposta dá seguimento à solução da Lei das Armas e da própria reforma, que prevê a aplicação da prisão preventiva a crimes violentos e organizados puníveis com pena de prisão inferior a cinco anos. Mas o relatório propõe que a medida só se aplique a casos de prática reiterada e para evitar que a reincidência conduza a penas de prisão elevadas, contrariando até as lógicas retributivas de alguns críticos.
No que se refere ao novo regime da liberdade condicional, tão criticado na discussão partidária pré-eleitoral, a "verdade estatística" também faz cair por terra qualquer tese que associe a reforma ao aumento da criminalidade. Com efeito, depois da reforma, aumentou a taxa de libertação com metade da pena, mas diminuiu muito a taxa de libertação após o cumprimento de dois terços da pena.
Todavia, os requisitos para a libertação com metade da pena são extremamente exigentes, compreendendo a não afectação da ordem e da paz social. Assim se explica que o número de libertados condicionalmente tenha diminuído na globalidade. Por isso, não há evidência estatística de qualquer relação causal entre o regime da reforma e o aumento de criminalidade relativamente a certos crimes.
Além disso, não consta do relatório cruzamentos estatísticos que revelem se o aumento de alguns crimes violentos verificado em 2008 dependeu dos novos regimes da prisão preventiva ou da liberdade condicional. E também não consta indicações sobre se o aumento dos crimes se deveu a reincidentes, o que
O desejo, patente em certos sectores, de usar este relatório como prova de convicções nunca antes demonstradas está condenado à frustração.
É urgente substituir a política dos desejos pela análise crítica e fundamentada da realidade, informando com rigor os cidadãos e alterando, sem histerismos, o que for necessário para melhorar o sistema penal e defender os interesses da comunidade."
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