Por Juiz Desembargador Rui Rangel
(in Correio da Manhã - 01.07.2010)
"O exercício da judicatura não é um emprego qualquer, mas uma sublime missão de criar e distribuir justiça. Não basta ser juiz para ser justo. É este juiz que eu gostaria de ter ao serviço da sociedade e do indivíduo.
Falar de justiça é falar de vida, de felicidade e tristeza, de esperança e de angústia. É falar de educação, de formação, de desenvolvimento económico, de protecção do meio ambiente e de outros recursos finitos. É falar da xenofobia, do racismo, da exclusão social, dos direitos dos imigrantes. É falar dos novos desafios da globalização, da crise financeira internacional, do papel do Estado na regulação do mercado e dos desafios impostos pela sociedade de comunicação, onde os media assumem uma função decisiva. É falar de confiança e do papel do juiz, como uma espécie de última instância na terra, o defensor e garante da lei e dos direitos de cada um, o árbitro de conflitos. É toda esta teia complexa de valores, de princípios e de interesses, que cumpre regular e pacificar.
Mas é esta nova ordem de interesses e de conflitos, esta nova dimensão a que a justiça é chamada a pronunciar - se, que lhe confere uma maior visibilidade e uma acrescida responsabilidade, amplificada pela cobertura dos media. Esta maior visibilidade, esta montra gigante em que se transformou a justiça onde tudo aparece exposto, com virtudes e fraquezas, é o maior desafio do juiz.
A justiça não está nem nunca foi pensada, e muito menos preparada, para responder a estes grandes desafios. E os juízes também não estão preparados para semelhante tarefa. Esta nova ordem exige um novo paradigma de juiz, com melhor e actual formação, que saiba decidir ouvindo os outros pensamentos, que aceite pensar em termos interdisciplinares, que seja imparcial, isento e independente, abandonando a figura do juiz majestático, autoritário e arrogante, do juiz insensível e que vê na lei os seus músculos, para fazer uma justiça que não é compreendida pelo cidadão. Que traga um novo modelo de juiz, não aquele que vive isolado e que vai “morrendo” aos poucos, atulhado com o excesso de tarefas burocráticas sem uma secretária, ou um assessor. E que ensine que o juiz é titular de um poder de soberania, que não é funcionário público e que não pode nem deve agir com medo.
Aquele que, com inteligência e bom senso, procura a partilha de conhecimentos e do saber, sem medo de que pareça estar a abdicar de uma parte do seu poder, que só faz sentido para melhor servir as pessoas.
Nós somos o espelho e a virtude das nossas instituições. Não ficamos mais modernos por fazermos parte do projecto europeu. Somos mais modernos se abraçarmos, para as nossas instituições, os desígnios da qualidade, da eficácia, da equidade e da transparência, fazendo com que o cidadão acredite na sua justiça.
O exercício da judicatura não é um emprego qualquer, mas uma sublime missão de criar e distribuir justiça. Não basta ser juiz para ser justo. É este juiz que eu gostaria de ter ao serviço da sociedade e do indivíduo."
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