O conselheiro de segurança interna

Por ALBERTO GONÇALVES, Dias contados, in DN Online

"Faz quase três anos que uma deputada do partido de Hugo Chávez, acompanhada por quatro jagunços, invadiu um programa de televisão, roubou o microfone ao jornalista que o apresentava, em seguida esbofeteou e insultou o homem e, a título de apoteose, atirou umas cadeiras e destruiu parcialmente o cenário do estúdio. A deputada, de sua graça Iris Varela, explicou mais tarde que o jornalista a difamara e que, portanto, agiu em defesa da sua honra. E acrescentou não tencionar processar ninguém para evitar que a oposição acusasse o governo local de perseguição à imprensa.

Na altura, a notícia deprimiu-me. Sobretudo por evidenciar a distância que separava Portugal do socialismo "bolivariano", que inúmeros intelectuais asseguram ser o radioso futuro das nações. No proverbial atraso pátrio, manso como a tia do outro, não havia políticos capazes de ir tão longe em benefício da respectiva honra. Ou, o que é dizer o mesmo, políticos tão honrados. Felizmente, agora já há.

Nem falo dos grandes estadistas que, na sombra, negoceiam canais inteiros a fim de calar calúnias. Falo dos pequenos parlamentares como o sr. Ricardo Rodrigues, que abafou com mestria, perdão, "tomou posse" dos gravadores dos jornalistas que o entrevistavam. A entrevista, que acabou a meio, destinava-se à revista Sábado, e as perguntas decisivas versavam as ligações do sr. Rodrigues a uma senhora que burlou em milhões de euros a CGD e aos boatos de pedofilia que, em 2003, o levaram a demitir-se do governo regional dos Açores. Semelhantes impertinências evidentemente configuram o crime de "violência psicológica insuportável", a razão avançada pelo sr. Rodrigues para o furto, perdão, a "acção directa".

Claro que a ausência, no episódio, de bofetões e cadeiras a voar mostra que ainda estamos longe do paradigma venezuelano. Mas a manutenção do sr. Rodrigues na AR, a solidariedade (com aplausos) que a bancada socialista lhe dedicou e o anúncio posterior da sua nomeação para o Conselho Superior de Segurança Interna (juro!) provam que já estivemos muito mais(...)"